Ninguém
quer trabalhar? Pois!
Em 2021, quarenta e sete anos depois da Revolução do Cravos e quarenta e
seis após o golpe que a travou e permitiu o regresso dos velhos poderes, o
Governo de Portugal, pela voz do seu ministro da Economia, anunciou ao país ter
decidido premiar os patrões que têm trabalhadores abrangidos pelo aumento
(miserável) do Salário Mínimo Nacional.
Pelo segundo ano consecutivo, o governo premeia os patrões cujas políticas
salariais são o espelho de um país confinado ao espartilho do trabalho mal
remunerado, de baixa e muito baixa produtividade, da precariedade e da
submissão ao “subsidiozinho”.
E não se pense que a medida visa apoiar os pequenos e muitos pequenos
empresários que, também eles se têm que multiplicar em “invenções “ para
conseguirem sobreviver.
O Governo, o mesmíssimo governo e o partido que o suporta, que se recusam
a revogar as normas mais gravosas da legislação laboral impostas pelas troikas
internacional e nacional, que enquanto empregador está a exaurir os serviços de
quadros médios e superiores necessários ao funcionamento eficaz do aparelho de
Estado. Que corre o sério risco (será que não é isso que quer?) de ver
paralisados o Sistema de Ensino e o Serviço Nacional de Saúde por incapacidade
de repôr os que se reformam e atrair novos quadros, apresenta-se “orgulhoso” em
subsidiar os patrões que pagam o SMN com um subsídio por trabalhador abrangido
de 12 euros/mês.
As centrais patronais, como já é habitual, lá vieram a público dizer que
é pouco mas é um bom sinal. Vislumbram – como eu – que independentemente do
montante é um sinal de afirmação que o partido socialista e o seu governo darão
continuação à vontade que os levou a derrubarem o seu próprio governo – o
regresso às políticas de favorecimento do capital em desfavor do trabalho e dos
trabalhadores.
E tudo isto num tempo e num país em que a parte da riqueza produzida e
depois distribuída para o trabalho é de pouco mais de 36% já abaixo da média da
“europa comunitária”.
Quando são vários os
estudos que nos mostram que em Portugal, hoje o número de pobres aumenta e
entre eles e com um número muito significativo há portugueses que empobrecem a
trabalhar. Um quinto da população portuguesa, segundo o INE vive na pobreza e
neste número 60% são trabalhadores efectivos. A análise
aos perfis dos empregados mostra que representam 32,9% dos pobres e 10,8%
do total da população com trabalho.
Tudo isto, e não é nada pouco, num tempo e num país em que a cada dia
patrões e a sua comunicação social, inundam as nossas casas e pensamentos com a
falta de gente para trabalhar, com hotéis, restaurantes e fabricas que não
conseguem recrutar pessoal, com o pessoal do campo a dizer-nos que é ano de
fartura de azeitona mas que não conseguirão gente para a recolher.
Com um governo apostado em governar (como diz mas não faz) à esquerda
seriam possíveis tais situações?
Mais, será possível a um país, seja qual seja, que aposte no Turismo (ou
qualquer outro sector económico) como sua principal ferramenta de
desenvolvimento e permita a esse sector manter-se como o que mais mal paga aos
seus trabalhadores, que fomente a precariedade e a sazonalidade. Um sector que
não forme, não cuide, não conserve?
Não, não é possível. Um país desenvolvido e moderno tem que assentar num projecto
de desenvolvimento credível e sustentado. Deve assentar, numa época em
que se desenvolvem novas tecnologias (num quadro de envelhecimento da
população e de uma acentuada quebra demográfica), sobretudo no desenvolvimento
e enriquecimento humano. Deve apostar de forma inequívoca na educação, na
formação, na valorização do trabalho e dos trabalhadores.
Que pensemos nisto, todos, quando fizermos as nossas escolhas!
Diogo Júlio Serra.
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