quarta-feira, 28 de março de 2018

INCOMPETÊNCIA OU MALDIÇÃO?

                                                                                  ( Foto de Alto Alentejo)

Incompetência ou maldição?

   A fábrica dos Robinson ou fábrica da rolha foi ao longo de quase dois séculos um factor de modernidade e desenvolvimento de Portalegre e, sempre, a principal empregadora dos portalegrenses.
Foi-o desde a sua fundação por George Robinson pai em 1840 e principalmente durante a gestão de George Robinson filho e continuou a sê-lo durante várias décadas quando em 1940 a família Robinson se afastou da empresa e esta passou para a posse duma sociedade de capital português.
   Desde a fundação até à década de 80 do século passado a Robinson continuou a garantir emprego a um número significativo de famílias portalegrenses e a levar o nome de Portalegre aos vários continentes mesmo quando as rolhas já haviam dado lugar a novas aplicações na construção civil e na aeronáutica.
   Quando a democracia política abriu portas ao regresso dos “velhos senhores”, os “chico-espertos” iniciaram o processo que em diferentes áreas e a coberto do poder político de então, haveriam de abrir caminho ao refazer dos monopólios.
   No sector corticeiro também foi assim. No processo de alianças, as aquisições e concentrações criaram o monopólio no sector deixando de fora, por vontade ou não das que ficaram, algumas empresas detentoras de know-how, de clientes, mas necessitadas de mudanças estruturais que os novos tempos impunham.
   A Robinson foi das que optou por não se deixar absorver e era no final do século passado “um sobreiro” com trabalhadores dedicados, know-how, clientes fiéis em vários continentes mas totalmente cercada por “árvores de outra qualidade” que assumiu morrer de pé. No sector, passou a nome maldito.
   O nome “maldito” colou-se à Fundação que visava manter viva a cultura operária e doar à cidade um espaço de memórias e de futuro e ainda perpectuar a industria corticeira em Portalegre.
O mesmo viria a suceder com uma nova empresa, a Robcork, anunciada em 2009, com o objectivo de continuar a Robinson, mas inaugurada apenas em 2015 e já encerrada.
   Que se saiba, esta empresa nem sequer arrancou com o processo produtivo. Viu ser-lhe declarada a falência em Janeiro deste ano. O Estado Português, detentor de 95% dos créditos da Robcork, recusou a proposta de viabilização apresentada e impôs a falência da Empresa.
   É maldição? É incompetência? Os culpados serão sempre entidades e pessoas exteriores à cidade e à região?
   Claro que não! Muitas das responsabilidades de chegarmos ao estado actual podem e devem ser encontradas no nosso território, entre decisores políticos e gestores de empresas e instituições mas, reconhecendo-o, é fundamental não perdermos a perspectiva do porquê e quem deve assacar com o principal dessas responsabilidades.
   Em relação à Corticeira Robinson está há muito identificada a “culpa”, a qual se deve às alterações estruturais necessárias e que não foram encetadas e à própria autarquia que não soube ou não quis garantir com a necessária agilidade a transferência da fábrica para instalações com as condições necessárias.
   Também em relação à Fundação são conhecidas muitas das razões e particularmente as que se prendem com a incapacidade financeira e política da sua principal/única proprietária.
   E a Robcork? Talvez também consigamos intuir. Mas é preciso que quem “esteve por dento da coisa” venha explicar o que na verdade se passou. E que não venham com o “paleio” de que se trata de um investimento privado e que, por isso, não tem nada a explicar senão aos seus accionistas.    Naquele investimento privado estão (pelo menos 12 milhões de euros) que serão pagos pelo pagador do costume.
   Aguardemos.

Diogo J. Serra

quarta-feira, 14 de março de 2018



Comboios: Vamos tê-los ou, vamos só vê-los passar?*

O problema das acessibilidades que não temos, continua a pesar significativamente no conjunto de constrangimentos ao desenvolvimento do nosso território.

São as vias rodoviárias ultrapassadas ou com insuficiências que não temos conseguido eliminar: os estrangulamentos do IP2, em Estremoz, a ponte de Santa Eulália que não permite a passagem veículos de médio porte sejam de passageiros ou de mercadorias, as vias ferroviárias desactivadas ou obsoletas, a auto-estrada que só nos toca, o IC 13 que teima em não se concretizar, etc…etc..etc…

Apesar disto, de tempos a tempos a nossa pacatez (?) é abalada por notícias que parece augurarem um tempo novo mas que retirado o involucro com que as mascaram, nos voltam a colocar no mais absurdo isolamento.

Agora tem sido “o tempo das ferrovias” com as trombetas do poder a anunciarem a chegada do comboio rápido e com os amplificadores locais a fingirem que “agora é que é”.

O lançamento da reconstrução de 11 km de via entre Elvas e o Caia e o início da via ferroviária, para comboios de mercadorias em velocidade alta, entre Sines e Elvas trouxe até nós os primeiros-ministros de Portugal e Espanha, uma comissária de Bruxelas, a comunicação social de um e outro lado da fronteira e muita propaganda e demagogia.

Entre nós, por desconhecimento, por má-fé ou por imposição ideológica, políticos e fazedores de opinião afadigaram-se em integrar o foguetório, desconhecendo ou fingindo não saber que esta iniciativa “imposta de fora” será, se não forem tomadas outras medidas, o acelerar e intensificar do nosso isolamento.´

Os exemplos são inúmeros e deveriam deixar-nos de sobreaviso.

A rede rodoviária que nos impuseram aí está a mostrar-nos que as auto-estradas que nos tocam, a A23 a norte e a A6 a sul não são as vias para o desenvolvimento que merecemos mas barreiras que acentuam o nosso isolamento.

Situação que se irá agravando se o IC 13 teimar em não ser construído em toda a sua extensão, se não for construída uma via que atravesse longitudinalmente o norte alentejano ligando a A23 à A6.

Em termos ferroviários o que é para nós fundamental é a electrificação da Linha do Leste em toda a sua extensão, a requalificação do material circulante e a disponibilização do transporte de passageiros com horários ajustados e, no caso da cidade capital de distrito, com a construção de um ramal que aproxime o comboio da cidade e dos portalegrenses.

A nova via que se anuncia para transportar mercadorias entre o Porto de Sines e Espanha só terá interesse para o Norte Alentejo se nessa via de velocidade alta circularem passageiros e se a Plataforma Logística do Sudoeste Ibérico ficar sedeada no Caia e se estender por ambos os lados da antiga fronteira e se todo este território, incluindo a sua capital – Portalegre for garantido acesso fácil e rápido.

Só assim, passaremos a ter comboio em vez de, como até agora, continuarmos a ver passar os comboios…

Diogo Júlio Serra
 *publicado no Alto Alentejo de 14-3-18

terça-feira, 6 de março de 2018





PASSO A PASSO, CONSTRUIR A IGUALDADE!*

Na próxima quinta-feira as mulheres de todo o mundo irão, de novo, elevar a sua voz para afirmarem a sua vontade de construírem o caminho que lhes/nos garanta a igualdade entre mulheres e homens na família, no trabalho e na sociedade.
De novo, o Dia Internacional da Mulher servirá para nos recordar que apesar do muito “caminho já feito”, ainda há muito mais para percorrer.
Como sempre, também em Portugal, o Dia Internacional da Mulher será assinalado como mais uma etapa numa caminhada que vem de longe e não pode parar, lado a lado com as “comemorações” de quantos e quantas, prisioneiros do mercantilismo consumista que teima em afirmar-se, assinalarão este dia com festarolas e petiscos ou, ainda pior, replicando nesse dia as piores práticas que alguns homens desenvolvem todos os dias do ano.
Mais uma vez ouviremos vozes, incluindo de mulheres, a afirmarem que a discriminação é coisa do passado, que “elas” nunca se sentiram discriminadas, que tais práticas há muito foram ultrapassadas…
Ainda bem que é possível, agora, comemorar o 8 de Março, ter e poder exprimir as mais díspares posições. E, sendo-o para todos ( a Democracia não tem donos) é-o ainda mais para as mulheres que são, recorde-se, também no nosso país, a maioria da população.
Todavia é fundamental que o 8 de Março sirva também para recordarmos, a par do que ainda tem que ser feito, o muito que foi conquistado pela mulher nas diferentes áreas da sociedade.
Na família as mulheres portuguesas só em 1978, com a entrada em vigor do D/L nº 496/77 de 25 de Novembro que “enterrou” o velho Código Civil, deixa de ter o estatuto de dependência do cônjuge. Até então até para ir comprar caramelos a Badajoz, tinha que obter autorização escrita do marido.
No trabalho, onde ainda há tanto para fazer, viram consagrada na Constituição da Republica de 1976 a igualdade de direitos embora a prática nos mostre como as mulheres continuam a ser discriminadas, sendo o rendimento mensal médio das mulheres, 19,9% inferior ao dos homens.


2010
2011
2012
2013
2014
2015
RMM[i]
18
18
18,5
17,9
16,7
16,7
GMM[ii]
20,9
20,9
21,1
20,8
20
19,9
( fonte: MTSSS/GEP – Quadros de Pessoal de 2015)

Na sociedade são também bem visíveis os avanços alcançados. Se recordarmos que na monarquia e na 1ª Republica as mulheres portuguesas estavam impedidas de votar e nem sequer podia sonhar virem a ser eleitas, ( o voto de Beatriz Ângelo[iii] para a Assembleia Constituinte foi tão só um “engano” dos legisladores que ainda esse ano viriam a emendar) e que hoje, a começar pelo nosso município, temos mulheres a exercerem os mais diversos cargos políticos, a integrarem as forças militares e de segurança, na administração da justiça…
Está tudo feito? Claro que não!
A comprová-lo aí estará, no próximo dia 8 de Março, por toda a Europa, a Greve Geral das mulheres e, no nosso país, a Manifestação convocada pelo MDM – Movimento Democrático de Mulheres que, no dia 10 de Março inundará Lisboa.
Que continuemos a afirmar a igualdade entre mulheres e homens.
A Sociedade que queremos: Livre e Justa não pode prescindir duma parte (da sua maior parte) da população.

Diogo Júlio Serra
* Publicado no Jornal Fonte Nova de 6-3-2018




[i] Remuneração média mensal
[ii] Ganho médio mensal
[iii] Beatriz Ângelo, médica foi a primeira mulher a exercer o direito de voto em Portugal