quinta-feira, 16 de dezembro de 2021

PODER LOCAL DEMOCRÁTICO, O SONHO CONTINUA!

 


PODER LOCAL DEMOCRATICO, O SONHO CONTINUA!*

No momento em que escrevo, dia 12 de dezembro – domingo, cumprem-se 45 anos desde esse outro domingo em que os portugueses e as portuguesas puderam pela primeira vez eleger os seus autarcas. Oito meses passados desde a primeira eleição livre e em que todos e todas, maiores de idade, puderam votar e elegeram a Assembleia Constituinte, o povo português voltava a ter a palavra para eleger o poder que lhe estava (e está) mais perto.

No distrito de Portalegre, os quinze executivos então eleitos e que iriam substituir as Comissões Administrativas eleitas pelos seus concidadãos para substituírem os autarcas nomeados pelas estruturas do fascismo mantinham as cores (politicas) dominantes na Assembleia Constituinte.

Eram eleitos do Partido Socialista doze dos 15 Presidentes de Câmara e os restantes três foram eleitos nas listas da FEPU, uma coligação constituída pelo PCP e pelo MDP/CDE mas, e fruto da inteligência da Lei das Autarquias, em cada executivo estavam representadas a quase totalidade das forças políticas presentes no distrito e os rostos que nas comissões administrativas haviam garantido a transição entre os executivos nomeados e os agora eleitos.

Em Portalegre, a vitória eleitoral do Partido Socialista colocou na cadeira presidencial o bancário Fernando Soares, acompanhado pelo, até à data, Presidente da Comissão Administrativa, Dinis Parente Pacheco e do eleito pela população em Assembleia Popular para esse cargo mas que declinou a favor de Parente Pacheco, o então jovem professor Adriano Capote, e também eleitos do PPD e do CDS: Manuel Calado, funcionário da Robinson e António Carrilho, médico veterinário. Do elenco faziam ainda parte mais dois eleitos pelo Partido Socialista: António Martelo, bancário e Domingos Sousa, engenheiro.

Que o legislador tinha razão ao decidir que os executivos municipais eleitos pelo método de hondt deveriam colocar nos executivos todas (ou parte) das cores que matizavam o ambiente político de cada território é-nos mostrado por esse executivo e pela obra que nos deixou.

Quatro décadas e meia depois constatamos quer a importância do Poder Local Democrático quer as profundas alterações sofridas pelos eleitos e pelas forças políticas que representam e em particular a involução verificada na percepção da importância e especificidade deste poder que é local e cuja proximidade com os cidadãos e os problemas o fazem ser diferente.

Hoje, e sem necessidade de saímos de Portalegre, constatamos a “parlamentarização” dos executivos e a incapacidade de governar os concelhos sem que, quem os preside detenha a maioria absoluta dos seus membros e, fruto dessa incapacidade de perceber que os entendimentos normais em mais de 95% das decisões do executivo têm que ser conseguidos, também nos restantes 5%. Mais, é preciso perceber que a receita para que tal possa acontecer não é o “comprar” de maiorias artificiais mas sim o estender do diálogo e da compreensão até atingir o consenso.

É difícil? É! Mas será tão menos difícil quando se têm como balizas (agora é moda dizer-se redlines) a Constituição da República e os interesses das populações que nos/os elegem e que dizemos/dizem ser o motivo da nossa/sua acção.

Mas regressemos a 1976 e às primeiras eleições para as autarquias e festejemos o Poder Local Democrático que ali se começou a construir. Festejemo-lo recordando os seus obreiros.

Dos quinze Presidentes de Câmara eleitos em 1976, no nosso distrito temos, felizmente, no nosso convívio quatro desses cidadãos. Quatro Presidentes eleitos pelos seus concidadãos de entre os “homens bons” de cada concelho: João Manuel Pista, bancário, eleito Presidente de Alter do Chão; Manuel Rui Nabeiro, industrial, hoje Comendador, eleito Presidente de Campo Maior; António José Falé Canoa, comercial, eleito Presidente de Monforte e Fernando Soares, bancário, hoje Comendador, eleito Presidente de Portalegre.

A pandemia obrigou ao adiar de uma justíssima homenagem que o Grémio Transtagano lhes preparara e que deveria ter ocorrido no passado dia 4 em Arronches e Monforte e que espero possa ser retomada quando comemorarmos Abril mas não pode fazer-nos esquecer quer o seu exemplar trabalho (naquele primeiro mandato e em todos os outros em que continuaram como autarcas) quer a importância de continuarmos a usufruir do Poder Local Democrático.

Não pode igualmente manter esquecida a necessidade de retomarmos os valores e os caminhos que o legislador consagrou em lei e a prática das várias décadas mostrou serem a sua maior valia: a especificidade deste “poder”, a importância de ter executivos que espelhem o todo de cada território e a “obrigatoriedade” de ultrapassar todas as barreiras que impeçam atingir o consenso na resolução de problemas que são consensuais e no aprovar das ferramentas que os permitam resolver.

Este é, penso, o caminho que temos que retomar!

Viva o Poder Local Democrático!

Diogo Júlio Serra

* publicado no Jornal do Alto Alentejo em  15-12-21

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