sábado, 9 de fevereiro de 2008

ACTIVIDADE CORTICEIRA EM PORTALEGRE. QUE FUTURO?

A actividade corticeira acompanhou o crescimento da cidade de Portalegre nos últimos cento e setenta anos.
Através da emblemática Fábrica de Cortiças de Portalegre, da família Robinson, a cidade e a região viram nascer e florescer uma indústria que foi ao longo dos anos, o motor e a referência do seu desenvolvimento.
A “velhinha” Robinson que começou por ser fábrica de rolhas, é hoje detentora de um invejável “know how” e rol de clientes que garantem que toda a sua produção (hoje destinada ao revestimento de pisos e à decoração de habitações) tenha colocação garantida nos exigentes mercados, americano e japonês.
A fábrica, fundada por um industrial inglês - Thomaz Reynolds – em 1837 e instalada numa parte do antigo Convento de S. Francisco foi, dez anos depois, adquirida por George Robinson, também inglês, conhecedor da cortiça e do seu manuseamento e que viria não só a dar-lhe o nome, mas a transformá-la numa das mais importantes unidades industriais do seu tempo.
Em 1881 data em que a administração passa para o filho, George Wheelhouse Robinson, a fábrica emprega já 560 operários.
Será sob a administração de George Wheelhouse Robinson que a indústria corticeira atinge o seu auge, em Portalegre e se inicia a sua vocação transfronteiriça.
Em 1891, adquire duas fábricas de rolhas em San Vicente de Alcântara e uma terceira é adquirida um ano depois, no mesmo “Pueblo Extremeño”. Desenvolve a política iniciada por seu pai, visando o controlo da matéria-prima necessária às suas indústrias e com esse objectivo, adquire inúmeras propriedades agrícolas com extensos montados[1]. Fruto dessas aquisições e da negociação com a Fazenda Pública para assumir a exploração de inúmeras áreas de cortiça, propriedade do Estado, fica com a capacidade de ser ele a controlar o abastecimento da matéria-prima necessária às suas indústrias.
No final do século XIX a fábrica da rolha de Portalegre empregava mais de 2000 trabalhadores entre operários e tiradores de cortiça e a sua importância enquanto motor de desenvolvimento da cidade e da região manteve-se por toda a primeira metade do século XX.
A partir de 1942, dez anos depois da morte de George Wheelhouse Robinson, a fabrica passou a ser gerida por diferentes estruturas accionistas fora do seio familiar mas todas elas mantiveram o nome Robinson, que ainda hoje ostenta e que é enquanto “Marca” o seu principal património.
Actualmente a Corticeira Robinson,[2] a mais emblemática empresa do Norte Alentejano atravessa uma das mais difíceis etapas da sua já longa existência.
Esta fábrica que funciona ininterruptamente, desde 1837, no antigo convento de S. Francisco em Portalegre, vê agora o seu futuro seriamente comprometido por persistirem as barreiras que impedem a sua deslocalização para a zona industrial.
As diferentes estruturas societárias e os diferentes gestores que dela se ocuparam não puderam, ou não souberam, continuar o caminho traçado pelos fundadores. Falhos de visão estratégica, não souberam “libertar” a velhinha Robinson dos equipamentos e das metodologias trazidas por Geoge Robinson da “sua” Inglaterra em tempos de revolução industrial, que na altura lhe garantiram o título das mais moderna e melhor organizada unidade industrial do Alto Alentejo mas que agora, a colocam como padrão de arqueologia industrial.
Nos últimos tempos a fábrica não consegue produzir o necessário para garantir a satisfação da carteira de encomendas e os custos de produção atiraram a empresa para situações de incumprimento para com os trabalhadores, a Segurança Social e a Fazenda Pública.
Apesar da gravidade da situação actual, não é esta a primeira vez que a veterana fábrica se viu em situações de aperto.
Ainda nos primeiros tempos da gestão de George Robinson foram os incêndios a originar avultados prejuízos. A sua dimensão e impacto levaram o industrial a criar, em 1903, a Corporação de Bombeiros Privativos que ainda hoje se mantém em actividade.
No início da década de 90, a fábrica tinha salários em atraso e corria o risco de vir a encerrar.
Em 1994 um grupo económico liderado por Carlos Melancia, adquire a empresa e anuncia a sua reabilitação financeira e comercial.
Foi este grupo, que ao longo dos últimos anos geriu a Robinson, desenhou o projecto da sua deslocalização para a Zona industrial e garantiu os financiamentos necessários para a sua implementação.
O projecto apontava para a criação de uma nova unidade, a Robinson Revestimentos, S.A., dotada das mais modernas tecnologias e com capacidade para garantir o aumento da produção, mantendo os elevados padrões de qualidade que lhe têm permitido fidelizar os seus clientes.
Á empresa mãe, a velhinha Robinson Bros, ficava destinada a importante tarefa de, mantendo-se nas instalações que habita há 170 anos, garantir a memória da indústria corticeira e abrir-se à cidade através da Fundação a quem deu o nome. Espaços museológicos, áreas expositivas, ateliers, jardins, zonas de lazer, espaços comerciais e de I&D, faziam parte do projecto que deveria ser corporizado pela Fundação Robinson.
As dívidas à Segurança Social e à Fazenda Pública eram já uma ameaça mas uma boa parte dos terrenos ocupados no centro da cidade, o riquíssimo espólio arqueológico-industrial e a rentabilização de outros espaços a par do apoio conseguido no âmbito do 3º Quadro Comunitário de Apoio garantiriam o saneamento financeiro da empresa e os investimentos necessários à implantação do projecto.
Necessitava-se tão só, que cada uma das partes envolvidas honrasse a quota-parte dos compromissos assumidos.
A Câmara Municipal de Portalegre garantiria a entrega do terreno infra-estruturado na zona industrial e assumiria, em parceria com a Fundação Robinson entretanto constituída, o interesse na compra à Segurança Social, do riquíssimo espólio arqueológico-industral da “velha Robinson”; a Segurança Social aceitaria o espólio da Robinson como paga da dívida existente; os trabalhadores aceitariam trabalhar mais dois/três anos nas péssimas condições que as antiquíssimas instalações impõem; a Administração garantiria entradas de capital necessárias a garantir a viabilidade do projecto.
Uma vez que todas as entidades reafirmavam a sua vontade em viabilizar a actividade corticeira em Portalegre, parecia ser fácil conseguir tal objectivo. Só que… a Câmara Municipal de Portalegre e a Fundação, que entretanto perdeu dois dos quatro parceiros iniciais, não “conseguiram” assumir face à Segurança Social o seu interesse no espólio da Robinson preferindo vir a adquiri-lo como “bem penhorado” e a primeira destas entidades não conseguiu, passados quatro anos, entregar o terreno devidamente terraplanado. Uma arreliadora pedra que entretanto apareceu no terreno impediu a Câmara de honrar o seu compromisso.
Não se conhece se a Administração conseguiu captar novos investidores, conhecido é o facto dos trabalhadores continuarem a laborar não só naquelas instalações mas ainda, muitas vezes, sem receberem atempadamente o respectivo salário.
Entretanto a Câmara Municipal, que assumiu a sua impossibilidade de entregar o terreno terraplanado conforme o compromisso assumido, propôs-se adquirir as instalações da Jonhson Controls,uma multinacional entretanto encerrada e vende-las à Robinson Bros.
Mantinha-se a esperança da Robinson conseguir instalar-se na zona industrial e dessa forma poder dispor dos fundos disponibilizados, garantir as produções necessárias a satisfazer as encomendas existentes, garantir e aumentar o postos de trabalho.
Para tanto, necessitava de executar o projecto aprovado pelo IAPMEI, pela banca e pelos credores até Junho de 2008. Na altura, Maio de 2007, não parecia ser uma missão impossível. Só que, de novo, a Câmara não “conseguiu”, até agora, honrar os seus compromissos e o espaço Jonhson continua indisponível para a Corticeira.
Ainda há quem acredite. Mas o prazo é cada vez mais escasso e a velhinha corticeira pode vir a ser vítima de assassínio.
[1] Floresta de Sobreiros ou Azinheiras.
[2] Sociedade Corticeira Robinson bros, S.A.