terça-feira, 26 de abril de 2022

A CONSTITUIÇÃO DE ABRIL

 



A CONSTITUIÇÃO DE ABRIL FESTEJA 46 ANOS DE VIDA.

A história constitucional portuguesa mostra-nos que em Portugal as Constituições são, quase exclusivamente o resultado de revoluções ou de contra-revoluções.

São (quase) sempre o resultado da vontade dos vencedores em verem consagradas na lei os princípios que os nortearam na tentativa do derrube do velho e na construção do novo regime.

Foi este sentimento que levou à Constituição de 1822, a primeira Constituição (da monarquia) Portuguesa e que dando seguimento à revolução liberal de 1820, consagrava o fim do absolutismo e abria portas a uma Monarquia Constitucional.

Seguiu-se a Carta Constitucional ou Constituição imposta em 1826, esta não diretamente ligada a uma revolução ou contra-revolução mas procurando impedir novas tentativas de retornar a uma monarquia absolutista.

Esta, a Carta Constitucional não foi inspirada por um revolução ou golpe de estado foi a razão da Revolta dos Marechais que a acusavam não apenas de ilegalidade, fora imposta pelo Rei, como de ser travão ao desenvolvimento do país.

A Constituição de 1838 substituiu a Carta Constitucional e garantiu a Monarquia Constitucional ao longo de sessenta e dois anos. Foi até agora a mais duradoura das Constituições portuguesas, tendo acompanhado a monarquia até ao seu derrube em 1910.

Seguiu-se a Constituição Republicana em 1911. Viria a consagrar o regime republicano e a revolução que o implantou. Teria o seu fim marcado pela contra-revolução iniciada com o golpe militar de 1926 que esmagou a democracia parlamentar e impôs a ditadura militar.

A Constituição Corporativa de 1933 viria a consagrar o regime ditatorial do Salazarismo e dar cobertura “legal” às atrocidades cometidas. Caiu com a Revolução de Abril.

Com o 25 de Abril, um golpe militar de imediato transformado em Revolução, é posto fim ao “Estado Novo” nome dado pelos salazaristas à ditadura terrorista que criaram e mantiveram por quase meio século.

Cumprindo o prometido pelo Movimento das Forças Armadas a 25 de Abril de 1975 realizam-se as eleições mais livres e participadas da nossa história que elegem os deputados constituintes de um Constituição para o Portugal Democrático.

A Assembleia Constituinte elabora e aprova num contexto de enorme luta politica e instabilidade social a Constituição de 1976, promulgada pela esmagadora maioria dos deputados (só o CDS votou contra) e considerada pelos diferentes países como uma das mais progressistas de todo o mundo.

É esta Constituição que cumpriu no passado dia 2 de Abril o seu 46º aniversário, que nos permitiu retomar os caminhos da democracia após meio século de ditadura e para a qual contribuíram com o seu trabalho e o seu voto, dois arronchenses de coração: o professor Domingos Pereira, natural de Elvas mas que para aqui viera muito jovem, aqui casara e trabalhava e aqui nasceram os seus filhos e José Magro, dirigente comunista, resistente anti-fascista, filho de um ilustre arronchense e que aqui muitas vezes encontrara abrigo face à repressão policial que permanentemente enfrentava.

O primeiro fora eleito deputado nas listas do Partido Socialista. O segundo eleito nas listas do PCP havia de ser eleito vice-presidente da Assembleia Constituinte.

Quarenta e seis anos de vida conferem-lhe o “estatuto” da segunda mais duradoura das Leis constitucionais que Portugal acolheu, título que deve juntar ao que o povo lhe atribuiu desde a primeira hora, o de Constituição de Abril.

Decorrido quase meio século e após nove revisões ao texto inicial a Constituição foi sendo depurada dos seus artigos mais datados e de alguns outros que obstaculizavam caminhos que a sociedade portuguesa e ou as maiorias políticas, circunstanciais ou não, foram exigindo, mas mantem no essencial as garantias que a tornaram uma das mais progressistas do mundo.

Hoje despida dos traços marcadamente ideológicos e descarregada dos sonhos dos que a construíram e ferida pelo incumprimento ou adiamento de alguns dos seus preceitos continua a ser o farol e o garante de um caminho de liberdade, igualdade e paz.

Para o constatarmos bastar-nos-á ler apenas UM ARTIGO. O seu artigo de abertura.

Artigo 1.º

República Portuguesa

Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária.

Nem tudo tem sido cumprido. Na verdade não tem sido cumprida sequer, por quem a jura cumprir e fazer cumprir mas para cada português, cada um de nós, não é um bem menor saber que os nossos direitos e garantias enquanto cidadãos e enquanto país, estão lá. Podemos sempre invoca-los!

Viva a Constituição que consagra aquele “dia inicial inteiro e limpo”!

Que se cumpra Abril!

Diogo Júlio Serra


segunda-feira, 25 de abril de 2022

25 de Abril Sempre. Fascismo nunca mais!

 


Intervenção de Diogo Júlio Serra*

Cumprimentos protocolares….

Os meus camaradas de Partido e os companheiros da CDU deram-me a súbita honra de usar esta tribuna para em seu nome saudar os portalegrenses, estejam onde estiverem, a Autarquia que a todos representa e todos os grupos políticos que também no nosso concelho e na nossa cidade esgrimindo consensos ou diferenças usufruem e consolidam a democracia e dessa forma honram Abril.

O facto de ser um, somos cada vez menos e ainda bem, dos que pela já muita idade, podemos testemunhar quer o dia a dia vivido num país esmagado pela ditadura salazarista, quer a chegada daquela madrugada azul e limpa como tão bem a definiu Sofia de Melo Anderson e a Revolução que de imediato permitiu, deverá ter pesado na decisão de me honrarem com a sua escolha.

Honra que desde já agradeço. Tanto mais porque ao darem-me a possibilidade de usar esta tribuna permitem que saúde todos quanto possibilitaram, realizaram, continuaram e defendem a Revolução dos Cravos: os homens e mulheres organizados ou não PCP que nas fábricas, nos campos e nas ruas resistiam à fascisação do país e levantavam bandeiras contra a fome e a guerra, contra a pobreza e a exploração e os capitães de Abril que derrubaram o regime de opressão e terror e que também souberam interpretar a vontade da população portuguesa que desde as primeiras horas inundou praças e avenidas exigindo o fim da guerra, a paz, o pão e a liberdade

 Comemorar Abril e a liberdade é usar em cada momento e em cada situação a liberdade alcançada. É tornar normal aquilo que em ditadura estava ao alcance de muito poucos – a liberdade de pensamento e a coragem de o afirmar e de pagar os custos dessa coragem, com perseguições, prisão e quantas vezes com a própria vida.

Estimados concidadãos,

Comemorar Abril é afirmar e valorizar todas as suas conquistas e reafirmar a nossa vontade e disponibilidade em cumpri-lo todos os dias. Mas é igualmente, não deixar esquecer quantos, também aqui, na nossa cidade e concelho nunca desistiram de lutar por Abril mesmo quando não era perceptível que O houvesse e muito menos ousássemos antever quando chegaria.

Permitam-me, pois, saudar algumas instituições portalegrenses que foram nesses tempos de escuridão escolas de cidadania e liberdade, alfobres de resistência e viveiros de esperança: A Cooperativa Operária, o Alentejo Futebol Clube e as muitas coletividades de cultura e recreio;   a Rabeca – Jornal democrata e baluarte da resistência ao salazarismo e, sobretudo, os ilustres portalegrenses que a partir de cada uma delas expandiam as virtualidades da democracia sonhada: João Diogo Casaca, Jornalista, proprietário e diretor da Rabeca, Feliciano Falcão, médico, que também dirigiu a Rabeca, João Belmiro Contro da Silva, eletricista, João Dias Mourato, corticeiro, Jorge Feliciano Arranhado, comerciante e dirigente desportivo (a quem o anterior executivo negou a atribuição do seu nome ao edifício que foi sede da União Operária Portalegrense e onde durante anos esteve a sede dos seu Estrela Futebol Clube) Florindo Madeira, primeiro Governador Civil, da democracia, António Teixieira, Manuel Pinho, José Manuel Barradas, Manuel Bagina, Júlio Maurício, Elisa Cassola Ribeiro, Joaquim Miranda da Silva, de entre os que já partiram, mas também os que ainda temos, felizmente entre nós: a Comendadora Domingas Valente, António Ventura, Eduardo Basso, Nicolau Saião, Joaquim Carrapiço, Nicolau Dias Ferreira, ligados á segunda fase da vida do Jornal a Rabeca, Adriano Capote, eleito para presidente da Comissão Administrativa, cargo de que abdicou a favor de Parente Pacheco, por se entender demasiado jovem para a função, o Antero, dirigente sindical da Lanifícios desde a fundação da Intersindical, António José Ceia dos Reis e António Milheiro, fundadores da União dos Sindicatos de Portalegre.

Alguns deles meus camaradas de partido mas todos eles e elas camaradas da resistência e construtores em Portalegre, dos caminhos que permitiram Abril e através deles a minha homenagem a todos quantos construíram e conservaram os caminhos de Abril.

Estimados concidadãos.

Com o 25 de Abril revolveu-se a vida no País e, por isso mesmo, não há faceta ou pormenor que o resumam – a revolução foi, no seu desabrochar imediato, uma explosão de liberdade, é certo, mas que não perduraria se, de imediato nuns casos, noutros a breve trecho, não imprimisse em todos os demais aspectos da vida a marca que lhe garantiu e garante sustentação.

Às operações programadas e depois executadas pelos Capitães de Abril e que desarmaram o regime opressor, associou-se a inundação de ruas e praças pela população que validavam a iniciativa militar e gritando, exprimiram livremente o que pensavam e queriam:

Liberdade de pensamento e de expressão sim, mas também liberdade de organização e de luta.

Luta por mais pão, luta por saúde, educação e justiça para todos.

 Exigiam-no e começaram de imediato a dar-lhe corpo. Com avanços e recuos, melhores ou piores resultados, mas sempre em confronto com as ideias e as práticas do passado e quase sempre em rutura total com elas.

Assim, comemorar Abril exige afirmar o que a Revolução representa e expressa enquanto processo libertador com profundas transformações na sociedade portuguesa e um dos mais altos momentos da vida e da história do povo português e de Portugal.

Comemorações em que é imperativo não deixar submergir o que ela foi e representou na avalanche interpretativa dos que lhe negam a sua natureza, alcance e características ímpares.

Celebrar Abril é evidenciar o que foi o fascismo e combater o seu branqueamento, é destacar a luta anti-fascista, pela liberdade e a democracia.

Celebrar Abril é assinalar o seu sentido transformador e revolucionário, não rasurar a memória colectiva que o envolve, afirmar o caminho que o tornou possível, rejeitar as perversões e falsificações históricas, denunciar os que o invocam para o amputar do seu sentido mais profundo, sublinhar o que constitui hoje de valores e referências para um Portugal desenvolvido e soberano que décadas de política de direita têm contrariado.

Por mais que reescrevam, Abril foi uma revolução, não uma “evolução” ou “transição” entre regimes, um momento e um processo de ruptura com o regime fascista, o derrube do fascismo e do que o suportava.

Abril foi possível porque é fruto de uma longa resistência antifascista, de uma abnegada dedicação à luta pela democracia e liberdade de comunistas e de outros democratas, de uma intensa luta de massas da classe operária, da juventude, do povo.

Comemorar Abril, é assinalar e afirmar todas as suas conquistas e continuar os caminhos para a sua defesa e garantir a concretização das que falta cumprir.

E porque estas são as comemorações organizadas pelo Município importa salientar que o Poder Local Democrático é ele próprio uma dessas conquistas.

Comemorar Abril é, também, defender e valorizar o poder local hoje ameaçado, pelo subfinanciamento, pela imposição de aceitar encargos disfarçados de transferência de poderes, pela ingerência tutelar, pela instrumentalização que procura reconduzi-lo, a mero executor técnico das opções de terceiros.

Comemorar Abril é exigir que se cumpra a Constituição e o que ela consagra e determina quanto à criação de regiões administrativas completando assim o edifício do poder local que continua por cumprir.

Comemorar Abril é reafirmar que o Poder Local Democrático continua vivo e com energia bastante para resistir e se regenerar se essa for a vontade dos que, nos seus órgãos, se dedicam à causa pública e se souberem juntar-lhe as mil vontades dos cidadãos que representam.

Comemorar Abril é também, particularmente neste momento em que se procura subverter os seus objetivos e retomar os velhos caminhos da intolerância e do ódio e se ouvem, de novo, os gritos de exaltação à guerra, saber interpretar, cumprir e fazer cumpri a Constituição da Republica.

Quando cumprimos o 48º aniversário da Revolução dos Cravos, cumprir Abril é, como sempre foi, reafirmar os seus valores e usar em cada dia a liberdade conquistada.

É impedir pelas palavras e por ações que os valores de Abril sejam sequestrados pelos que sempre os combateram.

É impedir o regresso do discurso do ódio, da imposição do pensamento único, da rotulagem como mau, de tudo o que não se deixa dominar, do regresso às posturas do “quem não é por nós é contra nós”, da divisão do mundo e das gentes entre os bons e os maus, da tentativa de colagem dos que sempre foram e são pela Paz a um dos lados da guerra.

Num tempo em que os senhores da guerra a trouxeram de novo para solo europeu, afirmar Abril é declararmos Guerra à Guerra, contra todas as guerras independentemente do espaço onde se desenvolvem e da cor da pele ou da religião das suas vítimas. É sermos militantes ativos pela Paz é, em suma, cumprir o Espirito de Abril e a Constituição que o Consagra.

25 de Abril Sempre.

 Fascismo nunca mais!

 

*Intervenção na sessão solene comemorativa

Do 25 de Abril, em nome da CDU/Portalegre


quarta-feira, 13 de abril de 2022

Os DDTs e os capatazes nacionais

 




Os DDTs(donos disto tudo) e os capatazes nacionais.

 

“Vem por aqui” — dizem-me alguns com olhos doces,

Estendendo-me os braços, e seguros

De que seria bom que eu os ouvisse

Quando me dizem: “vem por aqui”!

Eu olho-os com olhos lassos,

(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)

E cruzo os braços,

E nunca vou por ali…

(Extrato do Cântico negro de José Régio)

Não é a primeira vez. Já em outros momentos notámos a sua actividade com os mesmos intervenientes, os mesmos objectivos, os mesmos mandantes e os mesmos capatazes. A haver diferenças sê-lo-ão na violência e…no descaramento.

Todos a quem a preconceito ideológico ou o carreirismo não cegou já notámos, assistimos ou sofremos o discurso do ódio e o apelo à uniformidade de pensamento que de há uns tempos para cá tem atingido níveis que alguns pensámos não serem (de novo) possíveis.

A guerra, de novo trazida para a Europa, agora pelos oligarcas russos e ucranianos e orquestrada à distância por outros oligarcas que só aspiram a mais lucro, mesmo que, à custa da destruição e morte, agora na Europa e antes em inúmeras outras partes do mundo, serve como acelerador de acções visando impor ao “outro”, indivíduos territórios e nações, os conceitos e olhares de acordo com sua estratégia de rapina.

A partir das organizações que dominam, sejam a ONU,a UE ou as centrais de dados e da informação a nível mundial, ou a sua máquina de guerra - a NATO, desenvolvem mortíferas acções de guerra sejam-no no domínio estritamente militar, na economia ou na propaganda.

Uma guerra que sendo movida pela vontade de rapina dos recursos mundiais (da energia, do saber, e da água) pretende também controlar a nossa liberdade de agir e de pensar.

Em Portugal a “coisa” está a atingir patamares que devem alarmar todos quantos estão (deviam estar) comprometidos com Abril e a Constituição que o consagra.

Não é possível continuarmos a assobiar para o lado e não ver que esta é uma batalha a que não podemos fugir e, aqui, ao contrário de outras batalhas e outras paragens, as fronteiras não se demarcam entre a democracia e o nazi-fascismo nem sequer entre partidos e forças tradicionalmente colocados à direita e à esquerda da democracia parlamentar.

Não, desta vez, a batalha é entre os que estejam ou não organizados partidariamente, estejam ou não acantonados em partidos que se nos apresentam da direita, da esquerda ou de coisa nenhuma, são pela liberdade ou (apenas) dizem que o são. Agora, a linha de fronteira está entre os que são defensores e praticantes da liberdade e da democracia e os outros, digam-se ou não democratas, tenham no bolso o cartão do partido a,b, ou c ou não tenham cartão nenhum.

E é, identificados os campos, necessário tomar partido e agir.

Tomar partido pela Constituição que nos deve reger, que todos devemos cumprir e alguns juraram fazer cumprir.

Tomar partido pela dignificação do trabalho e dos trabalhadores. Tomar partido em defesa da (s)liberdade (s), individual e de grupo.

Tomar partido e agir! Agir tendo como horizonte o que o Sérgio nos ensinou”:

Só há liberdade a sério quando houver: a paz, o pão, habitação, saúde, educação Só há liberdade a sério quando houver Liberdade de mudar e decidir

Quando pertencer ao povo o que o povo produzir

 

Diogo Júlio Serra