quarta-feira, 30 de março de 2022

UM HINO À AMIZADE...

 


Um hino à amizade

No passado sábado participei numa iniciativa convocada pelo Movimento “Não podem ser sempre os mesmos a pagar” destinada a fazer publica demonstração do descontentamento face aos brutais aumentos dos preços, que agora com a desculpa da guerra, nos estão a empobrecer em passo rápido e a exigir medidas que permitam o alívio em vez da sobrecarga aos trabalhadores e restante população mais desprotegida.

Na moção lida e aprovada no final da iniciativa constatei com agrado que a mesma confirmava um profundo conhecimento da situação que está a flagelar os trabalhadores e as populações e não deixava de registar outras vítimas da carestia que sob a “desculpa” da guerra os especuladores continuam e intensificam as políticas que já haviam desenvolvido em tempos de pandemia para engrossarem com a desgraça alheia, os cofres e o poder do capitalismo.

Que a “culpa” do que já estamos a viver e do que ainda está a caminho, não é da Guerra mas sim do Capitalismo ficou ali claramente registado como igualmente ficou que a própria guerra é ela também uma consequência do Capitalismo.

A moção aprovada (também por mim) exige entre outras medidas a redução do IVA dos combustíveis, que os lucros escandalosos que as grandes empresas, das petrolíferas às cadeias alimentares, estão a registar sejam canalizados não para dividendos aos acionistas mas para um fundo que permita fazer face aos custos da energia.

E foi no decorrer dessa iniciativa de protesto e exigência quando com outros participantes comentava a presença, ali, de dirigentes e ativistas do PCP que constatámos o significado e justeza da palavra de ordem que estes não se cansam de afirmar - ” a teu lado, todos os dias ”.

Claro que constatámos também a dificuldade de alguns desligarem das motivações que vão do medo e do preconceito à cegueira ideológica e persistirem em não ver quem ganha e quem perde com os contextos onde nos enredam sejam eles a pandemia, as catástrofes “naturais” ou a guerra.

Ontem mesmo, no momento em que se iniciava a marcha de protesto, alguns que à partida concordam com a necessidade de travar os aumentos da energia e dos combustíveis mediam a iniciativa não pelos objetivos anunciados mas pelo posicionamento politico-ideológico de alguns participantes.

Percebi ali a enorme dificuldade em defender a verdade face ao preconceito e os muros que se erguem à perceção de que gestos e posições a favor da Paz mas recusando esquecer o que as origina não são necessariamente a favor de um qualquer dos contendores.

E compreendi, como e porquê, a recusa de parlamentares europeus em aceitarem baixar o IVA no armamento quando se recusa baixá-lo na energia e nos combustíveis, pode ser divulgado como recusa a defender a paz e de apoio a quem ordenou uma invasão militar.

 Entretanto também no passado fim-de-semana os Europeus ficaram a saber que ser a favor da Paz é retomarem práticas há muito entendidas como do passado e que os colonialistas sempre praticaram nas “suas” propriedades: a obrigação de comprarem nas lojas do patrão os bens que este disponibilizava a preços que ele próprio impunha e que em muitos casos significava entregar-lhe a totalidade da “féria” e ainda ficar em dívida.

Como todos ficámos a saber os Estados Unidos e a União Europeia assinaram um acordo que preconiza que os Estados Unidos fornecerão o gaz liquefeito à União Europeia a um preço que dizem-nos será apenas…oito vezes mas caro do que o preço até agora cobrado pelos Russos.

Ainda bem que são nossos amigos!

Diogo Serra

(publicado no Jornal do Alto Alentejo de 30-3-2022

quinta-feira, 17 de março de 2022

RUSSOS FORA DA UCRÂNIA/AMERICANOS FORA DA EUROPA!

 


“Felizmente nasceram branquinhos e de olhos azuis…”

A invasão militar da Ucrânia pelas tropas da Rússia suscitou por todo o chamado “Ocidente” uma imensidão de condenações e uma verdadeira onda de solidariedades.

Mesmo no país de onde partiu a invasão as manifestações de condenação e em defesa da Paz se fizeram e fazem sentir. Independentemente das razões que as “justificaram”, a favor da guerra só os loucos ou os que vivem do negócio da guerra e a quem a guerra faz “o negócio prosperar”.

Em Portugal e em particular na nossa região também tem sido grande a mobilização das populações, seja para condenarem a guerra, seja para se/nos solidarizarmos com as suas vítimas e particularmente, as mulheres e as crianças que procuram garantir a sua segurança fugindo das zonas atacadas.

Os países vizinhos e toda a União Europeia, a Inglaterra e outros países não integrados afirmam a sua solidariedade e organizam-se para retirar do teatro da guerra e acolher os muitos milhares de ucranianos idosos, mulheres e crianças que necessitam e procuram acolhimento e paz.

“Felizmente” (dentro da tragédia que os atingiu) nasceram “branquinhos e de olhos azuis” e não verão, como outros, a sua tragédia ser aumentada por arame farpado, recusas de entrada e morte mais ou menos acelerada. Ainda bem. Para eles e, talvez, para os milhões de refugiados a quem tem vindo a ser negada, quer a entrada nos países da União Europeia, quer as condições mínimas de sobrevivência.

Por cá, no nosso distrito, também temos assistido e saudamos as evoluções significativas na solidariedade com as vítimas da guerra ou da fome. São diversas as instituições que por solidariedade, por “moda” ou por marketing passaram da indiferença à ação.

Ainda bem que evoluíram. Espero que o façam com sinceridade embora, por mais que o tente, não consiga esquecer que em 2002, quando em representação da União dos Sindicatos procurava defender e apoiar os ucranianos e outros deslocados dos países do Leste, só encontrava ao meu lado os dirigentes e técnicos da Cáritas e a irmã Emanuel, uma freira em que o coração e a coragem eram inversamente proporcionais ao tamanho do corpo.

Os outros, muitos dos outros, afadigavam-se a ganhar dinheiro à custa da sua desgraça. Fosse alugando a preços indecentes qualquer buraco a que chamavam habitação, fosse sugando-lhes a força de trabalho a troco de migalhas.

Que a evolução seja uma realidade. Tanto mais que agora é a guerra que os “empurra” para cá.

Tenhamos esperança embora agora como antes, o posicionamento face à guerra não seja uniforme:

Uns, onde eu claramente me incluo são pela Paz e contra a Guerra, seja onde seja, envolva quem envolver:

Outros, demasiados, são contra a Invasão da Ucrânia e contra os Russos;

Outros, muitos, são contra a guerra se ela estiver perto da nossa/sua porta;

Outros ainda, são contra as guerras se estas não forem apoiadas pelos Donos Disto Tudo: os senhores da guerra e da propaganda.

E por último, também temos por cá, os inconscientes. Os que dizem querer Paz mas promovem a escalada do ódio.

Que a preguiça em separar a propaganda da informação e a iliteracia ou o preconceito que impedem a opinião informada, não nos leve a apoiar um novo desastre!

Que também aqui nos empenhemos a fazer o que tem que ser feito: apoio solidário a todas as vítimas da guerra que são agora as mulheres, as crianças e os idosos ucranianos que a guerra empurrou do seu país; gritar pela recuperação da Paz e batermo-nos com firmeza contra a Guerra, esteja ela onde esteja, atinja quem atingir.

Nesse percurso, lembremos aos governantes nacionais a necessidade de cumprir e fazer cumprir a nossa Constituição. Lembremos aos governantes do Mundo a necessidade de cumprir os acordos e resoluções que apontam como caminho para a paz o desarmamento e o fim dos blocos militares!

E no que aos exércitos diz respeito, gritemos bem alto e sem medo:

Russos fora da Ucrânia/Americanos fora da Europa!

Ainda é tempo!

Diogo Serra

quarta-feira, 2 de março de 2022

A Formiga no carreiro vinha em sentido contrário!

 


A formiga no carreiro vinha em sentido contrário…

 

À guerra não ligues meia

Porque alguns grandes da terra

Vendo a guerra em terra alheia

Não querem que acabe a guerra

(António Aleixo)

 

Os tambores da guerra voltam a rufar na Europa. É tempo de justificada apreensão e sobretudo de reflexão sobre as razões de não conseguirmos aprender com os erros, os nossos e os dos outros.

Antes de continuar esta reflexão que quero partilhar com os leitores do Alto Alentejo importa recordar-vos dois factos históricos e fazer uma “declaração de interesses”.

Os factos históricos:

- A União das Repúblicas Soviéticas Socialistas terminou, em 26 de Dezembro de 1991 por erros grosseiros e em alguns casos traição dos seus dirigentes e pela ação persistente e coordenada dos inimigos do (penso eu) futuro da humanidade, tendo dado lugar a um significativo número de países que acabariam por se distanciar do projeto soviético e integrar-se no capitalismo dominante.

O PCUS – Partido Comunista da União Soviética acompanhou o movimento de desintegração territorial “nacionalizou-se” e em cada país prossegue a luta pelos ideais em que acredita fazendo-o como sempre e em cada lugar, face às necessidades e nas condições em que age. Assim, o Partido Comunista da República da Rússia é o partido que lidera a oposição ao regime autocrático de Putin, enquanto o Partido Comunista da Ucrânia, que viu serem perseguidos e assassinados os seus militantes e ser declarado “ilegal” assume na clandestinidade o que entende ser a sua obrigação para com os ucranianos.

Agora a declaração de interesses. Enquanto cidadão português, convicto que o capitalismo não é, como não o foram os sistemas que o antecederam, o fim da história e que o futuro será, um dia, “De uma Terra sem amos, a Internacional” entendo Putin e o seu sistema autocrático tão desprezível quanto os regimes que a mando dos DNT semeiam guerras, fome e morte ao sabor dos seus mesquinhos interesses e condeno, agora como sempre, a invasão militar de um Estado soberano.

Terminada a “introdução” passemos agora ao que aqui me trouxe. Identifico-me com todos os que de forma sincera têm vindo a público mostrar a sua preocupação face ao novo conflito bélico que estalou na Europa. Revejo-me nas preocupações de quantos exigem o fim imediato da escalada belicista e na solidariedade com as suas vítimas que são, nesta como em todas as guerras, os que menos ou nenhuma culpa têm das razões que, quem as ordena pensam existirem.

Consigo perceber que muitas dessas vozes não tenham estado em situações anteriores, igualmente graves, algumas delas também na Europa, tão despertas como hoje, porque já cantava o Ary, “quando um povo acorda é sempre cedo”.

Não consigo é perceber como alguns de nós, pessoas vividas, cultas, “sensatas”, se deixem enredar pelo preconceito e não consigam sequer diferenciar a informação da propaganda e da contra propaganda.

Preocupação com a situação no Leste da Europa, envolvendo operações militares de grande envergadura da Rússia na Ucrânia, muito para além da região do Donbass, é por mim (e já agora pelo PCP, partido em que milito) claramente partilhada mas tal situação não pode/não deve permitir esquecimentos e mentiras: que não houve desmembramento territorial de países na Europa, esquecendo a destruição da Juguslávia e a carnificina que se abateu sobre ela; que um país, excepto a Rússia, tenha reconhecido independências de territórios pertencentes a países terceiros, veja-se de novo o passado recente no Kosovo, na Sérvia…ou fora da Europa o reconhecimento de fantoches auto-proclamados presidentes como o Juan Gaidó ou a sra Jeanine Añez, após terem fomentado o derrube dos Presidentes eleitos.

Também a questão da ocupação militar ou do fomentar de golpes de estado, assassínios, etc… aqui nem precisamos de sair do teatro de operações desta guerra: o que soubemos, calámos, ou dissemos do Golpe de Estado de 2014, que derrubou o governo legítimo na Ucrânia e em particular de que o estimulou e de quem dele beneficiou.

Por último, quando alguns de nós se procuram munir de justificações comparando situações vividas nos meses que antecederam a 2ª Grande Guerra, talvez valha a pena informarem-se melhor sobre quem são e o que fizeram e fazem alguns grupos militares que os órgãos da propaganda Ianque procuram transformar em heróis.

Sim, eu sei e concordo que os silêncios e omissões não devem impedir-nos nunca, agora também, de condenar a guerra e os seus mentores. Condenar a guerra, prestar solidariedade às suas vítimas e, sobretudo exigir a PAZ!

O que importa, a meu ver, é empenharmo-nos todos, no apelo à desescalada do conflito, à instauração de um cessar-fogo e à abertura de uma via negocial para a resolução pacífica do conflito na Ucrânia e à resposta aos problemas de segurança colectiva na Europa, no cumprimento dos princípios da Carta da ONU e da Acta Final da Conferência de Helsínquia.

E aqui, em Portugal, onde intervimos, penso que valerá a pena empenharmo-nos na exigência do cumprimento da Constituição da República Portuguesa e em particular no seu artº 7º, nº 2 “… a dissolução dos blocos militares e um sistema de segurança colectiva, com vista à criação de uma ordem internacional capaz de assegurar a paz e a justiça nas relações entre os povos.”

NÃO À GUERRA! VIVA A PAZ!

Diogo Serra*

publicado no Jornal do Alto Alentejo de 2-3-22