sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Apresentação da Publicação " Conflitos Sociais em Portalegre, no tempo dos Robinson.



Senhora Presidente do Conselho de Curadores da Fundação Robinson e Presidente do Município

Exmos Senhores membros do Conselho de Administração

Caras e Caros Convidados

Permitam que inicie esta apresentação dando-vos conta da enorme satisfação que o convite da Fundação me suscitou.

Apresentar-vos este importantíssimo trabalho da autoria do Professor António Ventura, neste dia e neste espaço que tanto dizem a todos os portalegrenses é para mim motivo de grande orgulho, tanto mais que como alguns de vós bem sabeis integrei durante algum tempo as equipas que procuraram e procuram neste Espaço Robinson preservar a nossa memória colectiva e contribuir para que hoje e no futuro este seja um local de fruição e de cultura.
Este local, que foi e é motor de desenvolvimento da cidade e do concelho, é sentido por cada portalegrense como uma parte de si próprio.
Ao longo de mais de um século “a Robinson” foi local de trabalho que marcou o ritmo da cidade, escola de participação cívica por onde passaram elementos da quase totalidade das famílias portalegrenses e ninho onde nasceram dos mais belos projectos que enriqueceram a cidade e as suas gentes.
O fim do século XX e as ideias de alguns de que o tempo da industria transformadora havia terminado, aliadas a actos de gestão e politicas desastrosas ditaram o encerramento da “velhinha” Robinson.

Para os muitos trabalhadores arrastados para o desemprego e para as respectivas famílias, já não havia em Portalegre a “almofada” que amorteceu outras crises de emprego no decorrer dos séculos anteriores. Para a cidade ficava o desafio de encontrar formas de preservar a memória e o espaço como património colectivo dos portalegrenses.

A nossa presença aqui, a assinalar mais um dia Robinson, mostra que independentemente das diferentes leituras que podem ser feitas, foi acertada a opção de criar a Fundação com o objecto de perpetuar a memória e a tradição corticeira do local.

Mas passemos agora à publicação.

Esta obra – conflitos sociais em Portalegre no tempo dos Robinson, da autoria do Professor António Ventura e editada pela Fundação Robinson  é tão só a continuação da intervenção cultural e cientifica que é marca da Fundação.

Ela é um extraordinário contributo para o conhecimento do quotidiano da nossa cidade nos séculos XIX e XX.

Esta publicação que é, como todas as que a antecederam, extremamente agradável à vista e ao tacto – ( alguns, não é o meu caso, tem-nas apelidadas de demasiado luxuosas) é igualmente pelo seu conteúdo um inestimável serviço que mais uma vez é colocado à disposição da cidade.

O Professor António Ventura dá-nos conta da conflitualidade entre capital e trabalho existente numa unidade industrial que marcou a nossa região mas leva-nos muito para além dessa realidade. Mostra-nos o papel que a Industria Transformadora e em particular a Industria Corticeira tiveram no crescimento da cidade e do concelho e as razões que lhe granjearam o título que ainda hoje orgulhosamente gostamos de lembrar – de cidade industrial.

Mostra-nos situações de crise e de desemprego que afligiram os portalegrenses nos séculos passados e como então, estávamos em melhor situação, para fazer frente a tais adversidades.

Num momento em que a cidade e o concelho se debatem com taxas de desemprego que há muito ultrapassaram os níveis controláveis, quando todos nos indignamos com o definhar do nosso comércio e o empobrecimento generalizado das gentes e da cidade, registamos o sublinhado que o Professor António Ventura nos deixa quando, a propósito da crise dos lanifícios dos finais do século XIX, na página 9, se refere à Industria em Portalegre.
“…A suspensão de pagamentos da Fábrica Larcher & Sobrinhos, em 1868, arrastou na sua queda a Companhia da Fábrica Nacional de Portalegre, lançando no desemprego cinco centenas de operários. O golpe de misericórdia foi desferido em 1896 com a falência da Companhia da Fábrica de Lanifícios de Portalegre. … Desse universo portalegrense em crise, a única excepção era a fábrica de cortiça do inglês George Robinson, fundada em meados do séc. XIX, e que assumiu, no último quartel de oitocentos, o papel de principal entidade empregadora”.

Se omitirmos as datas (1868 e 1896) e adaptarmos os nomes parecer-nos-á que estamos a falar do Portalegre de agora, com uma excepção importante. Nos finais do Século XX quando os lanifícios voltaram a atirar centenas de trabalhadores para o desemprego, quando a multinacional Jonson Controls abandonou a cidade e lançou no desemprego cerca de trezentos operários, quando as herdeiras da nossa Finicisa de dividiram e diminuíram drasticamente o numero de trabalhadores… a fábrica de cortiça do Inglês George Robinson já não podia absorver nenhuma da mão de obra disponível. Estava também ela do lado das que encerravam.

Esta publicação é, como atrás referi, muito mais que a história dos conflitos sociais daquela época.

Mostra-nos o crescimento da cidade e o seu tecido produtivo. A sua importância económica e a sua capacidade para atrair serviços.

Atractividade e serviços que hoje não tem.

Este importante trabalho do Professor António Ventura dá-nos conta do nascer do associativismo e do seu desenvolvimento.

Primeiro com o nascimento de associações mutualistas depois com o aparecimento de outras associações – como a sociedade União Operária cujo objectos incluíam “ o recreio, a confraternização, a instrução e a ilustração e por fim com o despertar da classe operária, o aparecimento das associações de classe do sindicalismo.

Por último, a interessante amostra feita através da imprensa da época, também ela em número e em capacidade de intervenção muito superior á actual, o Professor António Ventura deixa-nos “viver” os mais significativos conflitos que opuseram patrões e empregados na cidade e no concelho e mostra-nos os diferentes olhares dos atores políticos de então sobre esses mesmos conflitos.

Mostra a capacidade de organização e a solidariedade dos trabalhadores e trabalhadoras da cidade e do concelho e também, o alto preço que nalguns casos foi necessário pagar por essa solidariedade como é exemplo a prisão durante vários meses, dos 8 operários que participavam em Portalegre nas manifestações de solidariedade com os participantes da Greve Geral de Évora, em 1912.

Presente nesta obra a constatação de que a vida da cidade e o do concelho estiveram ao longo de muitas décadas intimamente ligadas à Robinson e à Industria Corticeira.

A Robinson foi ninho onde se iniciaram sonhos e consolidaram projectos. A Robinson, os operários e operárias corticeiras e os seus quadros técnicos foram o início de obras de grande envergadura que ainda hoje perduram: a Sociedade União Operária, os Bombeiros; a Cooperativa Operária Portalegrense; o sindicalismo.

Uma última nota para relembrar as razões da Greve na Robinson em 1911 e que hoje há noite será recordada

Razões que estão hoje na ordem do dia mas que em 1911 até para mentes mais abertas como as da família Robinson, não eram passíveis de fácil aceitação: a reivindicação das operárias para que as chefias da secção onde só trabalhavam mulheres fosse exercida por …uma mulher!


* as fotos são propriedade da Fundação Robinson