MORREU O “NOSSO” PALMEIRO!*
Acabara de me acomodar frente ao televisor para assistir ao jogo do meu
Benfica quando fui surpreendido pelo minuto de silêncio.
A justificação veio de seguida. Falecera um dos nossos. Um futebolista que
iniciara a caminhada para a conquista da Europa (do futebol). Morreu o
Palmeiro!
Nunca o vi jogar com a camisola do seu (e meu) clube de coração.
A única vez que o vi em ação, a jogar e a marcar, foi em Arronches no
velhinho campo do Rossio, num amigável entre o Atlético Clube de Portugal, para
onde se transferira, e o Sporting Club Campomaiorense.
Foi um dia em que Arronches se encheu de gente e de cor para ver o “filho
da terra” que muito correra naquele campo pelado envergando o mesmo equipamento
azul, amarelo e branco do Atlético, mas então do Atlético Clube de Arronches,
clube de onde partira para brilhar no Elvas e no Desportivo Portalegrense, numa
viajem que o levaria ao Benfica e à Seleção Nacional.
O “Xico” Feiteira, filho do eletricista que era também o dono e condutor do
único táxi então existente na vila, fintara o destino e tornara-se num ídolo
dos arronchenses, dos benfiquistas e dos portugueses: primeiro futebolista a
marcar no então novo Estádio da Luz, primeiro benfiquista a marcar na taça dos
campeões europeus, integrante da equipa das quinas que pela primeira vez venceu
“os espanhóis” e o marcador dos três golos com que garantimos tal feito.
Na vila haviam ficado os familiares a “tocarem” os negócios familiares. O
pai, que não aprovou a ideia do filho deixar o táxi para ir jogar futebol,
continuou a conduzir o único táxi de Arronches num tempo em que os automóveis
eram praticamente inexistentes no concelho. O irmão Luís a dar continuidade à
“arte” de eletricista e o irmão Emiliano que viria também ele a “fintar” o
destino e a fazer carreira como técnico autárquico, que enquanto esteve em
Arronches muito contribuiria para abrir horizontes aos jovens do concelho,
através do ensino e da cultura, em particular do teatro.
Mas voltemos ao “Xico” esse menino nascido em 1932, a 16 de Outubro e de
seu nome completo Francisco Luís Palmeiro Rodrigues e que iria imortalizar-se
como Palmeiro, médio direito, internacional A, que ao serviço do “seu” Benfica
haveria de conquistar três campeonatos Nacionais e três Taças de Portugal.
Como já referi, nunca o vi jogar de vermelho vestido fosse pelo seu Benfica
ou pela Seleção, mas como todos os miúdos de Arronches, segui o seu trajeto
através das crónicas impressas no Jornal a Bola e ouvindo religiosamente cada
relato domingueiro, na “radiotelefonia” que o Sport Lisboa Arronches – a
Maravilha- colocava, som no máximo, ao serviço dos seus associados.
O menino que começara no Atlético de Arronches com apenas 13 anos não era
apenas o ídolo da criançada. Era o “ herói “ de todos os Arronchenses: até do
pai que tudo fizera para que ele não se profissionalizasse no futebol.
Recordo com infinita ternura a solenidade com que a minha avó materna abria
a gaveta da cómoda e debaixo da roupa impecavelmente passada, retirava com
cuidados extremos o livrinho editado pelo Jornal a Bola tendo na capa a foto do
Palmeiro e que contava a vida do “nosso” herói.
Esta adoração tinha retorno. O nosso Palmeiro nunca deixou de ser nosso.
Nas escapadelas que fazia sempre que o futebol lho permitia, o afirmar-se,
sempre, como alentejano de Arronches. Já depois de retirado das lides futebolísticas
manteve o contacto regular com a sua terra e as suas gentes onde mantinha casa,
amigos e adoradores.
Homem de grande frontalidade não escondeu quanto ficou magoado com a forma
como a autarquia geriu o processo de o homenagear quando da atribuição do seu
nome ao Estádio Municipal mas com a mesma verticalidade logo esqueceu e aceitou
a justa reparação e acabaria por doar grande parte do espólio que hoje podemos
admirar no estádio com o seu nome.
Diogo Júlio Serra
*publicado no Jornal Fonte Nova de 1/2/2017
a foto é da autoria de Emílio Moitas
a foto é da autoria de Emílio Moitas
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