quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

O XICO DEIXOU-NOS!



MORREU O “NOSSO” PALMEIRO!*

Acabara de me acomodar frente ao televisor para assistir ao jogo do meu Benfica quando fui surpreendido pelo minuto de silêncio.
A justificação veio de seguida. Falecera um dos nossos. Um futebolista que iniciara a caminhada para a conquista da Europa (do futebol). Morreu o Palmeiro!
Nunca o vi jogar com a camisola do seu (e meu) clube de coração.
A única vez que o vi em ação, a jogar e a marcar, foi em Arronches no velhinho campo do Rossio, num amigável entre o Atlético Clube de Portugal, para onde se transferira, e o Sporting Club Campomaiorense.
Foi um dia em que Arronches se encheu de gente e de cor para ver o “filho da terra” que muito correra naquele campo pelado envergando o mesmo equipamento azul, amarelo e branco do Atlético, mas então do Atlético Clube de Arronches, clube de onde partira para brilhar no Elvas e no Desportivo Portalegrense, numa viajem que o levaria ao Benfica e à Seleção Nacional.
O “Xico” Feiteira, filho do eletricista que era também o dono e condutor do único táxi então existente na vila, fintara o destino e tornara-se num ídolo dos arronchenses, dos benfiquistas e dos portugueses: primeiro futebolista a marcar no então novo Estádio da Luz, primeiro benfiquista a marcar na taça dos campeões europeus, integrante da equipa das quinas que pela primeira vez venceu “os espanhóis” e o marcador dos três golos com que garantimos tal feito.
Na vila haviam ficado os familiares a “tocarem” os negócios familiares. O pai, que não aprovou a ideia do filho deixar o táxi para ir jogar futebol, continuou a conduzir o único táxi de Arronches num tempo em que os automóveis eram praticamente inexistentes no concelho. O irmão Luís a dar continuidade à “arte” de eletricista e o irmão Emiliano que viria também ele a “fintar” o destino e a fazer carreira como técnico autárquico, que enquanto esteve em Arronches muito contribuiria para abrir horizontes aos jovens do concelho, através do ensino e da cultura, em particular do teatro.
Mas voltemos ao “Xico” esse menino nascido em 1932, a 16 de Outubro e de seu nome completo Francisco Luís Palmeiro Rodrigues e que iria imortalizar-se como Palmeiro, médio direito, internacional A, que ao serviço do “seu” Benfica haveria de conquistar três campeonatos Nacionais e  três Taças de Portugal.
Como já referi, nunca o vi jogar de vermelho vestido fosse pelo seu Benfica ou pela Seleção, mas como todos os miúdos de Arronches, segui o seu trajeto através das crónicas impressas no Jornal a Bola e ouvindo religiosamente cada relato domingueiro, na “radiotelefonia” que o Sport Lisboa Arronches – a Maravilha- colocava, som no máximo, ao serviço dos seus associados.
O menino que começara no Atlético de Arronches com apenas 13 anos não era apenas o ídolo da criançada. Era o “ herói “ de todos os Arronchenses: até do pai que tudo fizera para que ele não se profissionalizasse no futebol.
Recordo com infinita ternura a solenidade com que a minha avó materna abria a gaveta da cómoda e debaixo da roupa impecavelmente passada, retirava com cuidados extremos o livrinho editado pelo Jornal a Bola tendo na capa a foto do Palmeiro e que contava a vida do “nosso” herói.
Esta adoração tinha retorno. O nosso Palmeiro nunca deixou de ser nosso. Nas escapadelas que fazia sempre que o futebol lho permitia, o afirmar-se, sempre, como alentejano de Arronches. Já depois de retirado das lides futebolísticas manteve o contacto regular com a sua terra e as suas gentes onde mantinha casa, amigos e adoradores.
Homem de grande frontalidade não escondeu quanto ficou magoado com a forma como a autarquia geriu o processo de o homenagear quando da atribuição do seu nome ao Estádio Municipal mas com a mesma verticalidade logo esqueceu e aceitou a justa reparação e acabaria por doar grande parte do espólio que hoje podemos admirar no estádio com o seu nome.

Diogo Júlio Serra
*publicado no Jornal Fonte Nova de 1/2/2017
a foto é da autoria de Emílio Moitas

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