Alentejo é,
mais que geografia, a vontade de um Povo!
Escrevo este texto à mesa do Espaço Alentejo na Quinta da Atalaia – Seixal, onde dentro de minutos irei participar num debate sobre o desenvolvimento (que queremos) do Alentejo.
Cheguei de manhã e já me cruzei com muitos portalegrenses, já conversei com amigos de há muitos anos que só por aqui costumo reviver, já viajei pelo mundo que mais um ano quis estar connosco na festa: comprei uma pequena tela em Cuba, tomei uma bebida no Chile, admirei os presépios da Palestina, ouvi afirmações de esperança e firmeza no Brasil e no Perú…
Mas é aqui, à mesa do Espaço Alentejo, mais concretamente no Restaurante de Beja, quando revejo alguns apontamentos que quero usar no debate em que vou participar que me ocorre a necessidade de trazer mais olhares a esta Festa. Confrontá-los com a realidade duma iniciativa que anualmente um grande coletivo põe de pé ao serviço de quem queira nela participar e, também, confrontar-nos com olhares que partem de posições que não são as nossas.
Revejo a lista dos Artistas que atuam na Festa e enojo-me, é esta a palavra certa, com os rótulos da mais requintada malvadez com que o capital e os seus megafones procuraram marcá-los.
Daqui, do Espaço Alentejo, lanço um olhar sobre o Espaço Criança onde centenas exercem a sua principal função: brincar! Reparo nas centenas de pavilhões ostentando entre ‘milhentas’ palavras de ordem uma que é comum a todos eles – Amizade e Paz!
Sorrio face ao contraste imenso entre o clima que se vive na Festa e ódio que alguns procuram semear mas que ficou à porta, do lado de fora, seja nas afirmações canalhas mascaradas de jornalismo, seja no cartaz que os netos e sobrinhos-netos dos bombistas que puseram em 1976 o país a ferro e fogo com destruições e assassinatos vieram agora colocar provocadoramente perto de uma das entradas da Festa.
A Festa está animada. Ainda nem todos conseguiram aceder ao tal ensopado no Restaurante de Évora ou ao arroz de Marisco do Litoral Alentejano mas dos muitos que começam a tomar lugar à minha frente para se integrarem no debate sobre o Desenvolvimento que queremos para o Alentejo ressalta uma extensa e colorida “mancha jovem”.
Boinas pretas e vermelhas ” à Ché“, camisolas ostentando os símbolos da Juventude, rodeados de gente madura ostentando boina alentejana e que transporta no olhar o orgulho de terem tirado aos agrários o poder com que durante décadas os escravizaram mas também a mágoa de voltarem a ver as suas terras serem alvo de operações de rapina e de destruição.
Os construtores da revolução e os netos desses revolucionários, lado a lado na construção do Alentejo sonhado.
O debate, os alentejanos preferimos chamar-lhe conversa, mostrou que as questões demográficas estão a colocar-nos numa situação complicadíssima com espaços à beira do total despovoamento, com o crescer das assimetrias com o resto do país e também no interior da região, com o aumento das desigualdades sociais e com um número cada vez maior de alentejanos e alentejanas que empobrecem a trabalhar.
Constatámos, mais uma vez, que não se resolvem problemas atirando-lhe dinheiro para cima e provámo-lo mostrando os milhões de euros canalizados para a Região que não resolveram e até agravaram a situação que vivemos. Novos e menos novos verificámos que mesmo algum investimento em infraestruturas na Região realizado ou anunciado, ocorreram/ocorrem não como resultado duma necessidade da Região mas porque o território Alentejano está no caminho de investimentos pensados por e no interesse de atores externos, sejam nacionais ou da União Europeia.
Consensualizamos facilmente a reivindicação que só é possível invertermos a gravíssima situação para onde temos vinda a ser empurrados se conseguirmos desenhar e aplicar politicas integradas de desenvolvimento integrado. Situação tanto mais difícil se continuarmos dependentes e afastados de órgãos de decisão colocados ‘a léguas’ do conhecimento, da necessidade e da vontade do Alentejo e dos Alentejanos.
Certezas apenas na nossa convicção, na capacidade de lutar e, claro, que para o ano teremos Festa outra vez!
Quinta da Atalaia, 3 de Setembro de 2022.
Diogo Serra
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