quarta-feira, 12 de maio de 2021

 


VELHOS SÃO OS TRAPOS! Verdade…(?)

Na passada semana tive a oportunidade de testar a verdade desta afirmação.

No âmbito do Projeto de intervenção que a Cooperativa Operária desenvolve com o patrocínio da Fundação Gulbenkian, visitei a Associação dos Bombeiros Voluntários de Portalegre e no dia seguinte, participei nas comemorações do 123º aniversário da COP que realizámos na sua sede, na rua com o seu nome.

Num e noutro lugar pude constatar quão longe estão a idade cronológica e a idade vivida.

Nos Bombeiros e no decorrer de uma visita guiada por um jovem operacional da respectiva Corporação, deparámo-nos com o entusiasmo, a coragem e a paixão juvenis, corporizados por uma Associação que já cumpriu cento e vinte e dois anos de existência.

Na sede da Cooperativa, na mesma sala que acolheu e concretizou o sonho de centenas de operários e das suas famílias, constatámos e comovemo-nos ao testemunhar que cento e vinte e três anos depois o sonho continua e na casa que os operários corticeiros disponibilizaram à cidade. Com um profundo respeito pelo passado, constrói-se o futuro e procuram-se caminhos para que os nossos “Maiores” continuem integrados e a brindar-nos com a sua experiência e saberes.

O Projecto ENTRE TEMPOS, cujo desenvolvimento foi dado a conhecer e a atenção que tem vindo a suscitar quanto à possibilidade de garantir a todos e todas que já deixaram a actividade profissional o serem e sentirem-se úteis, activos e sonhadores.

E sim, nestes dois espaços e momentos, era perceptível para todos que…Velhos são os trapos!

Mas, e há (quase) sempre um mas, houve mais semana para além destes momentos e quer no decorrer da Assembleia Geral da IPSS, cujos órgãos sociais integro, quer nos contactos mantidos com outras instituições dedicadas ao apoio (e institucionalização) a idosos foi-me possível constatar que para muitos, em particular para o governo “de Lisboa” os Velhos (os nossos pais e avós) são trapos que já tiveram a sua serventia mas são agora…descartáveis.

Hoje, por todo o distrito e acredito por todo o interior, as instituições que asseguram aos mais idosos, os cuidados que ao Estado competem estão a atravessar um período tão ou mais grave que aquele que a pandemia lhes/nos impôs: sem meios financeiros que acompanhem o aumento dos custos necessários para garantir as medidas de higiene e segurança que a situação impõe e abandonados pelo poder político que de longe, persiste em não perceber que não se pode tratar igual aquilo que é diferente.

No distrito existem instituições a viverem sob o espectro da insolvência, muitas sem condições para pagarem, no imediato, os salários e os subsídios aos seus trabalhadores e que têm como resposta por parte das instituições que as tutelam, que procurem junto dos familiares dos seus utentes as verbas de que carecem.

Para quantos gostam de afirmar que “estamos todos no mesmo barco” ou que “Vai tudo ficar bem” aí está o desmentido que a nossa realidade impõe. Nem estamos todos no mesmo barco, quando muito no mesmo mar, nem “vai tudo ficar bem”. Vão ficar sequelas e elas serão tanto maiores quando mais frágeis e desprotegidos estivermos.

As instituições que zelam e tratam os nossos idosos, eles próprios quase sempre os mais frágeis entre os frágeis porque já antes o eram, estão entre os que irão pagar o preço mais alto por terem nas instâncias do poder e particularmente no Governo da República quem desconhece a realidade dos territórios como o nosso ou, conhecendo, preferem fingir que não sabem.

E são estes comportamentos e omissões que nos mostram a diferença abismal entre as palavras e os actos. Que mostram que não há assim tantas diferenças entre os que apelidam os nossos maiores de “peste grisalha” e os que, mostrando-se incomodados com tal adjectivação persistem em “assassinar” as instituições e os projectos que na nossa região substituem o Estado, na sua obrigação de garantir a todos condições de viverem com dignidade.

Não permitamos que transformem os nossos “maiores” em peças inúteis e descartáveis.

Não destruamos as nossas “bibliotecas”!

Diogo Serra

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