quarta-feira, 3 de março de 2021

Foi ontem. Já passaram cem anos!



 

Foi ontem. Já passaram cem anos!*

…”E a cada novo assalto
cada escalada fascista
subirá sempre mais alto
a bandeira comunista.”

A quadra acima encerra o poema que Ary dos Santos escreveu no dia 11 de Agosto de 1975, registando o assalto fascista ao Centro de Trabalho de Braga. É ilustrativa da vida, do sonho e da firmeza daquele partido politico nascido a 6 de Janeiro de 1921 e que reflectia a evolução do movimento operário português e da sua experiência e consciência social e política.

Os primeiros anos de vida do PCP não foram fáceis. Não foi fácil afirmar uma ideologia revolucionária no movimento operário, tendo em conta, quer a estrutura e a composição da classe operária à época, quer a influência de anarquistas e socialistas.

O partido foi desde a primeira hora perseguido e boicotado pelo regime republicano (a sua primeira reunião marcada para sede Sindical de Lisboa, no edifício que depois viria a ser a sede da PIDE, foi impedida pela autoridades, com o argumento que nas sedes sindicais não se podia discutir politica), situação brutalmente agravada com o golpe militar de 28 de Maio de 1926 que conduziu à instauração da ditadura fascista.

 Com apenas cinco anos de vida, foi proibido e perseguido, passando a desenvolver a sua acção na clandestinidade e sob a brutal repressão que havia de prender e assassinar centenas de militantes e dirigentes.

Foi sob essa situação de brutal repressão e na mais severa clandestinidade que não só atravessou a longa noite fascista, como o fez garantindo a sua ligação aos trabalhadores e aos seus problemas, organizando a sua intervenção e luta em todos os sectores de actividade e criando as condições que, viriam a desaguar no 25 de Abril e na transformação do golpe militar na Revolução dos Cravos.

A revolução trouxe a liberdade e a acção politica à luz do dia mas não trouxe nem facilidades, nem o fim das perseguições e do ódio. O PCP continuou fiel aos seus princípios a ser cimento fundador da democracia e ferramenta dos trabalhadores para a construção da Democracia e, por isso, a ser o alvo principal do ódio e da violência orquestradas pelos serventuários dos monopólios e das forças politicas derrotadas em Abril.

O chamado verão quente de 75 (forma “elegante” com que a direita bem pensante intitulou a acção terrorista da direita caceteira, contra os valores de Abril), trouxe de novo à tona a coragem, a capacidade de sacrifício, a justeza dos valores defendidos e a ligação aos trabalhadores, deste partido nascido em 1921 e que, tantas vezes, já anunciaram estar moribundo ou mesmo morto e enterrado.

E aqui estamos. No próximo dia 6 de Março, em cem locais diferentes, por todo o país e também na nossa cidade, ouvir-se-á alto e bom som entoar a “Internacional”!

Perguntar-se-ão alguns, como é possível cem anos depois esta afirmação de vontade? Qual é a receita que permite esta vitalidade? A resposta é simples e entendível por quantos consigam libertar-se de peias e palas do preconceito. Esta vitalidade é possível pela profunda ligação aos trabalhadores e ao povo, por assumir nos seus valores e na sua prática as reivindicações e os anseios dos trabalhadores e das populações.

É possível porque este é o Partido de Bento Gonçalves, de Álvaro Cunhal, de Bento de Jesus Caraça, de Alfredo Dinis, Dinis Miranda, António Gervásio…mas é também, o partido do electricista João Silva, do corticeiro João Mourato, do comerciante Jorge Arranhado, do professor Manuel Pinho, do operário químico Leonardo Portalete, do economista Joaquim Miranda e de todos e todas que a ele e ao nosso povo deram e dão o que de melhor sabem e podem e…tantos deles a própria vida.

É possível viver um século e continuar menino, sempre com os olhos no futuro porque estes são:

“100 anos em que não há nenhuma transformação social, nenhum avanço ou conquista dos trabalhadores e do povo português a que não esteja directa ou indirectamente associada à iniciativa, à luta, à acção e à intervenção do PCP. São 100 anos de vida e de luta de um Partido que, orgulhoso da sua história e aprendendo com a sua própria experiência e a do movimento comunista e revolucionário internacional, assume com determinação e confiança as exigências da actualidade e do futuro.”

Que venham mais cem!

 

Diogo Júlio Serra

* publicado no Jornal Alto Alentejo em 3-3-2021