DO PODER LOCAL QUE CONSTRUÍMOS, À
DESCENTRALIZAÇÃO QUE NOS OFERECEM
Num tempo em que cada palavra
pode ter tantas interpretações quantos os olhos que a lerem, e quando os
vocábulos descentralização e desconcentrar tomaram conta do nosso quotidiano.
Quando as mesmas palavras são
usadas por quantos como eu defendem a descentralização do estado e o
cumprimento do preceito constitucional que aponta a criação das regiões administrativas,
mas também, são esgrimidas como arma de arremesso pelos representantes do
estado centralista e de quem nos territórios defende essas posturas, ambos
procurando convencer-nos da bondade das suas ações. Importará definir o que cada um quer dizer com
as palavras que esgrime.
Socorramo-nos das definições
inscritas no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora (5ª Edição) e da
Nova Enciclopédia LAROUSSE editada pelo Círculo de Leitores:
Diz-nos o primeiro:
Descentralização – Ato ou efeito de descentralizar; sistema politico
que impugna a acumulação dos poderes no Governo Central.
Desconcentrar - Descentralizar; diluir; espalhar; aliviar;
distrair-se.
A segunda define assim:
Descentralização – Sistema de organização das estruturas administrativas
do estado, que concede poderes de decisão e de gestão a órgãos autónomos,
regionais ou locais (coletividades locais, estabelecimentos públicos)
Desconcentrar – Disseminar; transferir os poderes de decisão para
certos agentes do poder central de grau hierárquico inferior
Posto isto, e conhecendo as
praticas do Estado Centralista que temos e as posições dos diferentes governos
que as foram executando, deveremos refletir sobre o que poderá significar esta
nova paixão governamental pela descentralização que, dizem-nos, motiva a propalada
reforma do estado.
Vejamos:
É no mínimo estranho que essa descentralização
não se inicie pelo cumprimento da Constituição da Republica que estabelece que
as Autarquias Locais são constituídas por três pilares: as freguesias, os
municípios e as regiões administrativas mantendo adiada a instalação das
Regiões Administrativas e apontando-se agora a necessidade de ser um comité de
peritos a definir se a Constituição da Republica é ou não para cumprir?
Mais, esta nova paixão não só mantem adiada a
constituição do 3º pilar do poder local como não tem impedido o governo da
republica de se comportar com agente liquidatário de centenas de freguesias por
todo o país. ___ só no Alentejo e, no que respeita aos municípios a sua
politica ser pautada, pelo dificultar permanente da sua atividade. Seja pelo
incumprimento ou insuficiência do seu financiamento, seja pela imposição de
formas de associativismo que visam o seu enfraquecimento, seja pela atribuições
de funções sem a devida capacitação técnica e financeira, seja pela tentativa
de lhes retirar atribuições e competências que são a matriz do poder local
democrático.
Num momento em que se discutem as
propostas do governo para a chamada descentralização é significativa, também, a
ausência do governo no Congresso dos Alentejanos e Alentejanas.
Disseram-nos não poderem aceder
ao nosso convite (nem fazerem-se representar) – Quer o Senhor Primeiro
Ministro, quer o Senhor Ministro da Infraestruturas – ele que até foi deputado
eleito por este círculo eleitoral, - por compromissos anteriormente assumidos.
(Espero sinceramente que não os vejamos, mais logo, a assistirem ao vivo ao
jogo da seleção, e não porque não entenda a importância dos nossos governantes
apoiarem com a sua presença a seleção nacional mas porque essa opção entre o
Alentejo e o futebol mostrar-nos-ia que os nosso governantes conseguiram até
adivinhar o futuro, uma vez que só quarta – feira, ficamos a saber da nossa continuidade
no campeonato do mundo.
E era, penso eu, extraordinariamente
importante que pudessem explicar-nos de viva voz a opções de nos arredarem do PNPOT,
e dessa forma imporem ao Alentejo uma barreira a quaisquer projetos e investimentos
financiados por fundos comunitários ou, porque persistem em não emendar o grave
erro cometido quando decidiram, a régua e esquadro, extinguir as freguesias. O que
pretendem quando querem passar para os municípios responsabilidades que são do
poder central e ao mesmo tempo os querem arredar de funções que sempre foram suas
como a gestão da água em baixa e do saneamento ou a intenção/imposição da
concessão de energia elétrica em baixa tensão.
Na ausência do governo e das
explicações que importava termos, reforça-se a minha convicção de que o que
está em movimento é nova ofensiva contra o Poder Local Democrático e os
territórios mais afastados dos grandes centros e sistematicamente empurrados
para a classificação de territórios do interior (leia-se territórios privados
de investimentos e serviços, discriminados pelo governo central e que
sobrevivem arredados de quaisquer rotas de desenvolvimento).
O Distrito onde estamos a
realizar o nosso Congresso é disso um exemplo rigoroso: Único distrito onde as autoestradas
só nos tocam e isto porque dois dos nossos concelhos – Elvas e Nisa se colocam
teimosamente no caminho entre Lisboa e Castelo Branco e entre Lisboa e Badajoz;
sem vias rodoviárias “decentes” a ligarem as três cidades do distrito e o
distrito com as regiões circundantes; onde o transporte ferroviário parou no
tempo – caso da Linha do Leste, a primeira linha ferroviária construída no país,
que não está eletrificada entre Abrantes e Fronteira, com um traçado que é
preciso alterar e com material circulante que não difere muito daquele com que
foi inaugurada.
Um distrito onde uma
infraestrutura absolutamente necessária e unanimemente exigida, que já foi
prometida milhentas vezes a Barragem do Pisão – continua teimosamente adiada e
muitas outras situações que certamente outros congressistas não deixarão de nos
colocar.
Do que se conhece e da recusa em
vir aqui explicar-nos o que pretendem, reforça-se a convicção de que esta
intenção governativa não é Descentralização (assumindo o conceito como Sistema
de organização das estruturas administrativas do estado, que concede poderes de
decisão e de gestão a órgãos autónomos, regionais ou locais (coletividades
locais, estabelecimentos públicos) nem sequer Desconcentração - Disseminar;
transferir os poderes de decisão para certos agentes do poder central de grau
hierárquico inferior.
O que se trata é de DESRESPONSABILIZAÇÃO.
Desresponsabilização do poder central que
sacode a água do capote para o capote para o Poder local em áreas que deve ser
o Estado a garantir. Como sabemos, tais processos nunca são acompanhados dos
indispensáveis recursos, designadamente financeiros e aí
estão as preocupações de vários autarcas de que assim voltará a suceder. Tanto
mais que é sabido que quanto mais se tem exigido das câmaras municipais, maiores têm sido os
cortes orçamentais a que se têm sujeitado.
Sendo certo que a Regionalização, apesar da sua
necessidade ser por todos reconhecida, não integra a temática deste nosso
Congresso não é possível deixar de trazer aqui a importante decisão da Comissão
Promotora do AMAlentejo de, dando seguimento às decisões e preocupações do
Congresso de Troia, promover uma iniciativa cidadã e propor a criação da Comunidade
Regional do Alentejo.
A sua concretização será como o próprio preâmbulo do projeto
de Lei o refere: um passo no aprofundamento da democracia participativa, um
avanço no princípio da subsidiariedade, uma afirmação de respeito da autonomia
das autarquias, uma porta aberta à efetiva descentralização democrática da
administração pública e um elemento para a promoção do desenvolvimento
harmonioso de mais de 1/3 do território nacional num espaço territorial cuja
coerência é há muito reconhecida, como o comprova a existência da CCDR –
Alentejo e cuja identidade está há muito comprovada, o que só por si justifica
a sua criação.
Assim todos os queiramos!
Comunicação ao Congresso AMAlentejo
Sem comentários:
Enviar um comentário