segunda-feira, 2 de julho de 2018




DO PODER LOCAL QUE CONSTRUÍMOS, À DESCENTRALIZAÇÃO QUE NOS OFERECEM

Num tempo em que cada palavra pode ter tantas interpretações quantos os olhos que a lerem, e quando os vocábulos descentralização e desconcentrar tomaram conta do nosso quotidiano.
Quando as mesmas palavras são usadas por quantos como eu defendem a descentralização do estado e o cumprimento do preceito constitucional que aponta a criação das regiões administrativas, mas também, são esgrimidas como arma de arremesso pelos representantes do estado centralista e de quem nos territórios defende essas posturas, ambos procurando convencer-nos da bondade das suas ações.  Importará definir o que cada um quer dizer com as palavras que esgrime.
Socorramo-nos das definições inscritas no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora (5ª Edição) e da Nova Enciclopédia LAROUSSE editada pelo Círculo de Leitores:
Diz-nos o primeiro:
Descentralização – Ato ou efeito de descentralizar; sistema politico que impugna a acumulação dos poderes no Governo Central.
Desconcentrar - Descentralizar; diluir; espalhar; aliviar; distrair-se.
A segunda define assim: 
Descentralização – Sistema de organização das estruturas administrativas do estado, que concede poderes de decisão e de gestão a órgãos autónomos, regionais ou locais (coletividades locais, estabelecimentos públicos)
Desconcentrar – Disseminar; transferir os poderes de decisão para certos agentes do poder central de grau hierárquico inferior
Posto isto, e conhecendo as praticas do Estado Centralista que temos e as posições dos diferentes governos que as foram executando, deveremos refletir sobre o que poderá significar esta nova paixão governamental pela descentralização que, dizem-nos, motiva a propalada reforma do estado.
Vejamos:
É no mínimo estranho que essa descentralização não se inicie pelo cumprimento da Constituição da Republica que estabelece que as Autarquias Locais são constituídas por três pilares: as freguesias, os municípios e as regiões administrativas mantendo adiada a instalação das Regiões Administrativas e apontando-se agora a necessidade de ser um comité de peritos a definir se a Constituição da Republica é ou não para cumprir?
 Mais, esta nova paixão não só mantem adiada a constituição do 3º pilar do poder local como não tem impedido o governo da republica de se comportar com agente liquidatário de centenas de freguesias por todo o país. ___ só no Alentejo e, no que respeita aos municípios a sua politica ser pautada, pelo dificultar permanente da sua atividade. Seja pelo incumprimento ou insuficiência do seu financiamento, seja pela imposição de formas de associativismo que visam o seu enfraquecimento, seja pela atribuições de funções sem a devida capacitação técnica e financeira, seja pela tentativa de lhes retirar atribuições e competências que são a matriz do poder local democrático.
Num momento em que se discutem as propostas do governo para a chamada descentralização é significativa, também, a ausência do governo no Congresso dos Alentejanos e Alentejanas.
Disseram-nos não poderem aceder ao nosso convite (nem fazerem-se representar) – Quer o Senhor Primeiro Ministro, quer o Senhor Ministro da Infraestruturas – ele que até foi deputado eleito por este círculo eleitoral, - por compromissos anteriormente assumidos. (Espero sinceramente que não os vejamos, mais logo, a assistirem ao vivo ao jogo da seleção, e não porque não entenda a importância dos nossos governantes apoiarem com a sua presença a seleção nacional mas porque essa opção entre o Alentejo e o futebol mostrar-nos-ia que os nosso governantes conseguiram até adivinhar o futuro, uma vez que só quarta – feira, ficamos a saber da nossa continuidade no campeonato do mundo.
E era, penso eu, extraordinariamente importante que pudessem explicar-nos de viva voz a opções de nos arredarem do PNPOT, e dessa forma imporem ao Alentejo uma barreira a quaisquer projetos e investimentos financiados por fundos comunitários ou, porque persistem em não emendar o grave erro cometido quando decidiram, a régua e esquadro, extinguir as freguesias. O que pretendem quando querem passar para os municípios responsabilidades que são do poder central e ao mesmo tempo os querem arredar de funções que sempre foram suas como a gestão da água em baixa e do saneamento ou a intenção/imposição da concessão de energia elétrica em baixa tensão.
Na ausência do governo e das explicações que importava termos, reforça-se a minha convicção de que o que está em movimento é nova ofensiva contra o Poder Local Democrático e os territórios mais afastados dos grandes centros e sistematicamente empurrados para a classificação de territórios do interior (leia-se territórios privados de investimentos e serviços, discriminados pelo governo central e que sobrevivem arredados de quaisquer rotas de desenvolvimento).
O Distrito onde estamos a realizar o nosso Congresso é disso um exemplo rigoroso: Único distrito onde as autoestradas só nos tocam e isto porque dois dos nossos concelhos – Elvas e Nisa se colocam teimosamente no caminho entre Lisboa e Castelo Branco e entre Lisboa e Badajoz; sem vias rodoviárias “decentes” a ligarem as três cidades do distrito e o distrito com as regiões circundantes; onde o transporte ferroviário parou no tempo – caso da Linha do Leste, a primeira linha ferroviária construída no país, que não está eletrificada entre Abrantes e Fronteira, com um traçado que é preciso alterar e com material circulante que não difere muito daquele com que foi inaugurada.
Um distrito onde uma infraestrutura absolutamente necessária e unanimemente exigida, que já foi prometida milhentas vezes a Barragem do Pisão – continua teimosamente adiada e muitas outras situações que certamente outros congressistas não deixarão de nos colocar.
Do que se conhece e da recusa em vir aqui explicar-nos o que pretendem, reforça-se a convicção de que esta intenção governativa não é Descentralização (assumindo o conceito como Sistema de organização das estruturas administrativas do estado, que concede poderes de decisão e de gestão a órgãos autónomos, regionais ou locais (coletividades locais, estabelecimentos públicos) nem sequer Desconcentração - Disseminar; transferir os poderes de decisão para certos agentes do poder central de grau hierárquico inferior.
O que se trata é de DESRESPONSABILIZAÇÃO.
Desresponsabilização do poder central que sacode a água do capote para o capote para o Poder local em áreas que deve ser o Estado a garantir. Como sabemos, tais processos nunca são acompanhados dos indispensáveis recursos, designadamente financeiros e aí estão as preocupações de vários autarcas de que assim voltará a suceder. Tanto mais que é sabido que quanto mais se tem exigido das câmaras municipais, maiores têm sido os cortes orçamentais a que se têm sujeitado.
Sendo certo que a Regionalização, apesar da sua necessidade ser por todos reconhecida, não integra a temática deste nosso Congresso não é possível deixar de trazer aqui a importante decisão da Comissão Promotora do AMAlentejo de, dando seguimento às decisões e preocupações do Congresso de Troia, promover uma iniciativa cidadã e propor a criação da Comunidade Regional do Alentejo.
A sua concretização será como o próprio preâmbulo do projeto de Lei o refere: um passo no aprofundamento da democracia participativa, um avanço no princípio da subsidiariedade, uma afirmação de respeito da autonomia das autarquias, uma porta aberta à efetiva descentralização democrática da administração pública e um elemento para a promoção do desenvolvimento harmonioso de mais de 1/3 do território nacional num espaço territorial cuja coerência é há muito reconhecida, como o comprova a existência da CCDR – Alentejo e cuja identidade está há muito comprovada, o que só por si justifica a sua criação.
Assim todos os queiramos!
Assim saibamos merecê-lo!

Comunicação ao Congresso AMAlentejo

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