O difícil
equilíbrio entre o eu e o nós!*
As nossas gentes, ou melhor, aqueles e aquelas que têm lugar marcado nas
redes sociais, voltaram a um fervilhar de entusiasmo que pensava eu, só tinha
sido possível em período eleitoral.
Desta vez a propósito das licenças (ou a falta delas) para a realização de
produções ruidosas na zona histórica da cidade em horário noturno, as redes
sociais voltaram a ser o lugar privilegiado para trocar argumentos e,
sobretudo, para alguns manterem acesa a chama da contestação ao executivo
municipal em nome dum auto proclamado combate à Inércia e pelo direito ao seu
conceito de modernidade e bem-estar.
Em causa o não licenciamento de atividades de animação e convívio, na via
pública, até de madrugada. Mais concretamente, iniciativas de Bares situados na
Praça da Republica, por ocasião da Baja e de uma Tuna do IPP que pretendia
igualmente promover uma festa na mesma praça, embora em data diferente.
Para os organizadores dos eventos e para uma certa juventude aguerrida o
não licenciamento dessas festas nos moldes pretendidos pelos seus promotores é
a “prova provada” de que esta cidade nunca sairá do que chamam o marasmo, da
sua aversão à juventude e aos estudantes.
Para a autarquia e para muitos dos moradores daquela zona que vêm de há
muito exigindo da autarquia que esta lhes garanta o descanso a que tem direito,
trata-se tão só de garantir os direitos dos moradores. O direito ao descanso e
à tranquilidade que se deve sobrepor à vontade de quantos entendem legítimo
trazer os bares e o seu convívio para fora dos espaços que lhes estão
destinados.
Estes interesses já bem difíceis de conciliar tornam ainda a tarefa mais difícil
quando na discussão entram com toda a força os posicionamentos político-partidários
que estiveram recentemente em confronto e que os resultados eleitorais não conseguiram
esbater.
Muito mais que conflito de interesses intergeracional o que se assiste nas redes sociais é o
retomar dos conflitos político-partidários entre os que entendem os resultados
eleitorais do passado dia 1 como o legitimar das posições e politicas de quem
voltou a vencer e dos que entendem que foi a “burrice duns quantos” um dos
candidatos derrotados apelidava-os de ”
gentes da serra “ a impor-nos/lhes mais quatro anos de “Inércia”.
Como sempre a maioria das opiniões, quantas vezes as mais inflamadas, são
colocadas pelo coração, sem a análise distanciada do que está em causa e
quantas vezes sem sequer terem tomado conhecimento sério e completo do que está
verdadeiramente em causa.
Sendo compreensível a frustração dos organizadores e dos jovens e menos
jovens que habitualmente participam nesses eventos, tanto mais se já tinham
assumido compromissos financeiros na perspetiva de que iriam ver satisfeitas as
suas pretensões, não podemos descartar e a autarquia muito menos, a necessidade
de garantir aos moradores daquelas zonas da cidade o direito ao descanso e à
proteção face aos exageros que em geral acontecem a partir de tais eventos.
Então não há nada a fazer? Claro que há!
Em primeiro lugar importa agilizar o diálogo entre os organizadores e a
autarquia para que os primeiros conheçam atempadamente se vão, ou não, poder
realizar os eventos com as características e nos lugares para onde haviam sido
pensados.
Se os prejuízos dos promotores são devidos ao terem-se adiantado à decisão
da autarquia, será um problema da sua responsabilidade. Se pelo contrário só
avançaram por falta de resposta atempada ou pela presunção de que iriam ser
licenciados então as culpas tem que ser assacadas à autarquia. Mas independentemente
destas razões, promotores ou autarquia, têm que dar o primeiro passo na
definição de espaços que garantam a qualidade dos eventos e o descanso dos
moradores.
Os eventos de rua devem ter lugar em espaços que não colidam com os
direitos (nomeadamente ao descanso) dos portalegrenses e os seus promotores
devem ter por parte da autarquia as facilidades (nomeadamente logísticas) que
garantam o acesso fácil de quantos queiram neles participar.
E não me digam que não há alternativa à Praça da Republica ou outro
qualquer local no centro histórico. Todos conhecemos vários espaços com condições
para receberem tais eventos!
Diogo Júlio Serra
* publicado no Jornal Fonte Nova de 31 de Outubro de 2017