Empobrecer a trabalhar!*
Os números do
desemprego têm vindo a descer significativamente nos últimos meses, também no
nosso distrito.
Tal fica a
dever-se à conjugação de dois fatores distintos: a perda acelerada de
residentes, na sua maioria em idade ativa e a criação de algum emprego nas
cidades do distrito, fruto das melhorias verificadas na nossa economia.
A presidente do
nosso município afirmava recentemente ser Portalegre o concelho do distrito
onde o emprego mais cresceu.
Será assim! O
problema é que o emprego criado, no concelho e no distrito, é no fundamental
precário, de curto prazo e muito mal pago.
Nas unidades
industriais onde esse crescimento se tem feito sentir, o recrutamento é feito
através de empresas alugadoras de mão-de-obra e como é de calcular, uma parte
significativa dos custos do trabalho são absorvidos não pelos trabalhadores mas
pela empresa que ali os coloca.
No setor dos
serviços, em particular no turismo, o emprego criado não só não acompanha o
crescimento verificado no setor como se usa e abusa do recurso ao trabalho a prazo,
precário e muito mal pago e o mesmo se passa em setores onde se verificam
manifestas carências de emprego mas essas carências são supridas por
contratação a conta-gotas ou pelo recurso à contratação a prazo e à mão de obra
desempregada.
No nosso
distrito, profundamente envelhecido, à situação dos trabalhadores em idade
ativa acresce a dramática condição de quem está reformado e estes são a maioria
da nossa população.
Estas situações, apesar
das tímidas baixas verificada no desemprego registado, obrigam a generalidade
das famílias a sobreviverem com rendimentos baixíssimos que estimam-se com uma
média que não ultrapassa os 300 euros per capita.
Tal significa que uma franja muito significativa da população trabalhadora
empobrece mesmo a trabalhar, ou tendo trabalhado toda uma vida. Uma situação
que não pode deixar-nos indiferentes. Uma “vergonha” que nos impõe não apenas
que a reconheçamos, mas possamos agir para a alterar.
Porque continuamos assim?
O
barómetro recentemente divulgado pelo Observatório sobre Crises e
Alternativas (CES/UC) confirma o que os dados do Instituto Nacional de
Estatística e outras fontes já vinham apontando: a recuperação do emprego está a
ser feita com uma maior generalização da precariedade.
Do universo de contratos em vigor e que foram
assinados depois de Novembro de 2013, mais de metade são precários
– a termo certo (45%) ou a termo incerto (18,4%). O trabalho temporário
representa 7,1% dos 1,146 milhões de contratos em vigor analisados. O
restante corresponde a vários tipos de contratos precários e, uma parcela
marginal, a trabalhadores contratados sem termo a tempo parcial.
Os dados sobre as remunerações mostram ainda que os
salários dos trabalhadores com contratos precários são, em média, de 600
euros – um valor que se aproxima ainda mais do salário
mínimo nacional quando se trata de trabalho temporário e que denuncia
a tendência para que o salário mínimo se torne a norma em vez da exceção. Isto
é tanto mais grave na nossa região onde a quase totalidade da contratação
efetuada o foi através dos contratos a termo e no fundamental com recurso às
empresas alugadoras de mão-de-obra.
O bloqueio da contratação coletiva tornado realidade pela
ação conjugada do patronato, do governo e das entidades criadas para os
assessorarem, tem imposto no país e em particular na nossa região o
empobrecimento contínuo de quem trabalha, o envelhecimento e despovoamento
acelerados.
Por tudo isto a razão das ações e lutas dos trabalhadores e em particular
as manifestações de 3 de Junho promovidas pela CGTP-IN e que tiveram uma
significativa participação dos trabalhadores do distrito mas que a opinião pública
local ostensivamente ignorou ou, pior, quis transformar numa polémica a forma
como as estruturas sindicais locais promoveram a sua divulgação.
Neste caso houve gente que viu a árvore e não viu a floresta enquanto
“outros com melhor vista” viam a floresta mas quiseram ocultá-la.
Critérios…
Diogo Júlio Serra
* publicado no Jornal Alto Alentejo de 12-07-2017
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