quinta-feira, 13 de julho de 2017

Empobrecer a trabalhar


Empobrecer a trabalhar!*
Os números do desemprego têm vindo a descer significativamente nos últimos meses, também no nosso distrito.
Tal fica a dever-se à conjugação de dois fatores distintos: a perda acelerada de residentes, na sua maioria em idade ativa e a criação de algum emprego nas cidades do distrito, fruto das melhorias verificadas na nossa economia.
A presidente do nosso município afirmava recentemente ser Portalegre o concelho do distrito onde o emprego mais cresceu.
Será assim! O problema é que o emprego criado, no concelho e no distrito, é no fundamental precário, de curto prazo e muito mal pago.
Nas unidades industriais onde esse crescimento se tem feito sentir, o recrutamento é feito através de empresas alugadoras de mão-de-obra e como é de calcular, uma parte significativa dos custos do trabalho são absorvidos não pelos trabalhadores mas pela empresa que ali os coloca.
No setor dos serviços, em particular no turismo, o emprego criado não só não acompanha o crescimento verificado no setor como se usa e abusa do recurso ao trabalho a prazo, precário e muito mal pago e o mesmo se passa em setores onde se verificam manifestas carências de emprego mas essas carências são supridas por contratação a conta-gotas ou pelo recurso à contratação a prazo e à mão de obra desempregada.
No nosso distrito, profundamente envelhecido, à situação dos trabalhadores em idade ativa acresce a dramática condição de quem está reformado e estes são a maioria da nossa população.
Estas situações, apesar das tímidas baixas verificada no desemprego registado, obrigam a generalidade das famílias a sobreviverem com rendimentos baixíssimos que estimam-se com uma média que não ultrapassa os 300 euros per capita.
Tal significa que uma franja muito significativa da população trabalhadora empobrece mesmo a trabalhar, ou tendo trabalhado toda uma vida. Uma situação que não pode deixar-nos indiferentes. Uma “vergonha” que nos impõe não apenas que a reconheçamos, mas possamos agir para a alterar.
Porque continuamos assim?
O barómetro recentemente divulgado pelo Observatório sobre Crises e Alternativas (CES/UC) confirma o que os dados do Instituto Nacional de Estatística e outras fontes já vinham apontando: a recuperação do emprego está a ser feita com uma maior generalização da precariedade.
Do universo de contratos em vigor e que foram assinados depois de Novembro de 2013, mais de metade são precários – a termo certo (45%) ou a termo incerto (18,4%). O trabalho temporário representa 7,1% dos 1,146 milhões de contratos em vigor analisados. O restante corresponde a vários tipos de contratos precários e, uma parcela marginal, a trabalhadores contratados sem termo a tempo parcial.
Os dados sobre as remunerações mostram ainda que os salários dos trabalhadores com contratos precários são, em média, de 600 euros – um valor que se aproxima ainda mais do salário mínimo nacional quando se trata de trabalho temporário e que denuncia a tendência para que o salário mínimo se torne a norma em vez da exceção. Isto é tanto mais grave na nossa região onde a quase totalidade da contratação efetuada o foi através dos contratos a termo e no fundamental com recurso às empresas alugadoras de mão-de-obra.
O bloqueio da contratação coletiva tornado realidade pela ação conjugada do patronato, do governo e das entidades criadas para os assessorarem, tem imposto no país e em particular na nossa região o empobrecimento contínuo de quem trabalha, o envelhecimento e despovoamento acelerados.
Por tudo isto a razão das ações e lutas dos trabalhadores e em particular as manifestações de 3 de Junho promovidas pela CGTP-IN e que tiveram uma significativa participação dos trabalhadores do distrito mas que a opinião pública local ostensivamente ignorou ou, pior, quis transformar numa polémica a forma como as estruturas sindicais locais promoveram a sua divulgação.
Neste caso houve gente que viu a árvore e não viu a floresta enquanto “outros com melhor vista” viam a floresta mas quiseram ocultá-la.
Critérios…
Diogo Júlio Serra

 * publicado no Jornal Alto Alentejo de 12-07-2017

Sem comentários: