quinta-feira, 17 de julho de 2008

O Alentejo face aos novos desafios.*

Trazer-vos o contributo da mais representativa organização de trabalhadores é não só motivo de orgulho pessoal mas também de significativa responsabilidade. Esforçámo-nos, por isso, para corresponder aos objectivos deste 14º Congresso e, também, às preocupações partilhadas por todo o Secretariado de que o Congresso deixasse de vez a constatação da “desgraça”, para se concentrar no futuro.

Procurámos trazer ao 14º Congresso as propostas dos trabalhadores e trabalhadoras que no Alentejo, organizados na CGTP - Intersindical Nacional, desenvolvem diariamente uma acção sindical combativa e propositora visando o duplo objectivo de combater as desigualdades e garantir o desenvolvimento.

Nas discussões travadas nas diversas estruturas da CGTP na Região, não foram poucas as vezes que nos confrontámos com a necessidade de vos trazer aqui um discurso “diferente” despido dos chavões tradicionais ou, como gostam de dizer os nossos adversários, esquecermos a “cassete”. Todavia a razão imperou sobre a vontade: não é possível discurso diferente quando se mantêm inalteradas as politicas que o tornam inevitável.

Não é possível construir novos caminhos se não tivermos em conta as razões que nos impõem o actual posicionamento.

Caras e Caros Congressistas

Em Maio de 1987 quando da realização do 2º Congresso do Alentejo, também em Beja, uma das comunicações do Movimento Sindical apresentada por José Figueira e José Serra em nome da União dos Sindicatos do Distrito de Évora, denunciava o desemprego como o maior flagelo da região que (cito) “…aliado à falta de investimentos em sectores e subsectores e ao boicote de outros (Reforma Agrária), estrategicamente importantes para o desenvolvimento desta região, tem levado ao empobrecimento de muitas populações bem como ao aumento da emigração.”

Hoje, vinte e um anos depois e de novo na cidade de Beja, é possível termos um discurso diferente?

Podemos pôr de lado a preocupação então demonstrada face ao desemprego na região? Deixou de ser verdadeira a denúncia da falta de investimentos, do empobrecimento das populações, do aumento das desigualdades ou da necessidade de emigrar?

Vejamos:

No que se refere ao desemprego a situação não melhorou e o Alentejo mantém, apesar da perda acentuada de população (despovoamento) e em particular de activos, (na maioria jovens) um desemprego que teima em não se afastar das três dezenas de milhar.




No que respeita ao empobrecimento das populações e ao aumento das desigualdades a situação não é diferente: O Alentejo continua a garantir aos que aqui vivem e trabalham um rendimento significativamente abaixo do já baixíssimo rendimento médio Português.

Em 2005 o Rendimento Colectável/ per capita era no Alentejo, de 12,8 mil euros enquanto a média do país se cifrava em 13,7 mil euros e o poder de compra das famílias, no Alentejo, fixava-se 14 pontos percentuais abaixo da média nacional.

Esta situação é ainda mais grave se atendermos que uma parte muito significativa da população alentejana é constituída por reformados e pensionistas que auferem reformas e pensões de miséria, por um número muito significativo de desempregados e por uma população empregada (TPCO) que aufere salários muito baixos. Daqui resulta que um número muito significativo vive com dificuldades e conforme tem vindo a ser denunciado, um cada três alentejanos sobrevive com um rendimento que não ultrapassa os 10 euros/dia.

Quanto às desigualdades, basta lembrar quer os números do Eurostat quer o estudo do Prof. Bruto da Costa sobre a situação no país (o detentor da maior desigualdade entre todos os membros da comunidade), para aferirmos a situação vivida no Alentejo, mas importa também recordar que a situação de desequilíbrio se faz sentir entre as diferentes regiões.
Num país, que comanda o pelotão Europeu das desigualdades, o Alentejo é camisola amarela.

O movimento sindical, não é indiferente ao fenómeno político nacional e internacional bem pelo contrario, durante décadas temos alertado e feito propostas.

No período de tempo que medeia entre 2000 e 2005 a riqueza continuou a concentrar-se em Lisboa, passando de 36,8% do PIB nacional, em 2000 para 37% em 2005

No que respeita à situação no interior da Região, os vários indicadores sócio-económicos começam a evidenciar a emergência de manifestações de disparidades entre as sub-regiões e, por essa via, a fragilizar uma das nossas principais valias: a unidade e coesão territorial interna da Região Alentejo.

Podemos assim concluir, que vinte e um anos depois e esgotado o ciclo de aplicação de três significativos envelopes financeiros disponibilizados por três quadros comunitários de apoio, o Alentejo manifesta o mesmo tipo de problemas estruturais e os sintomas de fragilidade económica e social, caracterizados pelo 2º Congresso em 1987 e esta conclusão impõe-nos, aos sindicatos e à Região, a necessidade de manter o registo reivindicativo, a denúncia da falência das políticas impostas e dos responsáveis pela sua imposição ao país e ao Alentejo.

Estamos conscientes, que não chega constatar e denunciar esta realidade.

É fundamental que consigamos alterar o rumo e delinear e aplicar politicas que tenham em conta as necessidades e as potencialidades desta região e, sobretudo que possamos garantir que o actual QREN não venha a sofrer das mesmas insuficiências que os anteriores pacotes financeiros e possa ajudar a colocar-nos nos caminhos do desenvolvimento económico e social que ambicionamos e merecemos.

O Congresso deverá, em nossa opinião, assumir os compromissos necessários a garantir o crescimento, diversificação e modernização da base económica regional, o reforço da coesão territorial interna, a criação e qualificação do emprego e da valorização do trabalho e o combate à proliferação das situações de pobreza e ao aprofundar das desigualdades.

Tais compromissos pressupõem a unidade necessária para apresentar, discutir e conseguir a definição e aplicação de políticas nacionais de combate às disparidades regionais e de diferenciação positiva das regiões mais debilitadas. Mas pressupõem igualmente a disponibilidade da região para assumir desafios e quantificar metas para o seu próprio desenvolvimento.

É nesse sentido que propomos ao Congresso e aos alentejanos e alentejanas que assumamos como objectivo regional:

- Aumentar, no período de vigência do QREN, a participação do Alentejo no PIB nacional em 1,3% passando em 2013 a representar 8% pondo fim à estagnação dos últimos anos que nos mantêm a contribuir com apenas 6,7% do PIB nacional.
- Aumentar os rendimentos médios do trabalho de forma a atingirmos em 2013, 90% da média nacional.

Como conseguir tais objectivos?

Impõe-se-nos convencer o país que Portugal nunca poderá desenvolver-se se persistir em manter um terço do seu território, detentor de enormes potencialidades e capacidades essenciais para a modernização do país, impedido de contribuir para esse desenvolvimento.

Para tanto é absolutamente necessário que os alentejanos (os homens e mulheres que aqui nasceram, os/as que aqui vivem e trabalham, os/as que amam o Alentejo) sejam chamados a opinar sobre o seu próprio futuro, que possam dispor de órgãos de poder regional de capazes de pensarem e operacionalizarem as politicas indispensáveis ao potenciar da riqueza e do desenvolvimento.

Entendemos, temo-lo aprovado nos nossos congressos em cada um dos distritos da região, que não é sensato, continuar a adiar a regionalização.

Esta Região, e entendemo-la enquanto o Alentejo histórico, incluindo os distritos de Beja, Évora e Portalegre e os concelhos do litoral integrados no distrito de Setúbal, deverá ser dotada de um poder regional legitimado pelo voto e dotado de poderes que até agora estão na esfera do governo central.

Será este Alentejo e este poder legitimado pela vontade dos alentejanos e alentejanas quem deterá as condições e a vontade de aproveitar todas as capacidades existentes na Região e as que advém da sua privilegiada localização no contexto ibérico para definir uma verdadeira estratégia de desenvolvimento:

Uma estratégia de desenvolvimento assente na criação e valorização do trabalho que permita dar resposta à necessidade de qualificar e fixar os recursos humanos e atrair novos activos.

Que garanta a manutenção de uma das nossas principais potencialidades – a coesão territorial - e que os modelos de gestão profundamente centralizados e politicamente governamentalizados dos anteriores Quadros Comunitários de Apoio vêm pondo em causa e que a governação do actual QREN estimula quer através da aposta na competitividade face à coesão territorial quer pela discriminação que impõe no que se refere a investimentos âncora com particular ênfase no norte alentejano.

Que aposte na definição de uma nova base económica regional, apostada no aumento do produto regional e de criação de emprego, assente na valorização dos produtos endógenos e em particular nas fileiras de produtos e serviços claramente diferenciadores face às regiões limítrofes como o são os produtos agro-alimentares de qualidade certificada, o riquíssimo património cultural e paisagístico, a fileira do montado e da cortiça, a existência de Alqueva e das suas potencialidades.

Apostada em dotar a região com as infra-estruturas ainda em falta e que passam por uma aposta séria na modernização da rede ferroviária a par da aposta na rede de alta velocidade, no terminar a malha rodoviária que garanta a ligação norte sul e a ligação por auto-estrada a todas as capitais de distrito e de todas as capitais de distrito às províncias extremenhas limítrofes.

Assumindo a importância estratégica do sector industrial em diferentes centros urbanos da região e a necessidade de multiplicação de projectos inovadores em parceria com as instituições de ensino superior.

Apostando no papel da Universidade e dos Politécnicos como centros de investigação, de construção de saber e motor de desenvolvimento.

São estas as premissas, aliadas à construção de espaços onde seja afirmada e consolidada a vontade dos alentejanos e alentejanas, que podem alterar para melhor a situação existente e impulsionarem a consolidação do Alentejo Desenvolvido Solidário e Coeso que tem sido a referência e a razão da luta de gerações de alentejanos.

Não devemos esperar, nem queremos, que outros façam o que a nós nos compete mas também não devemos, nem queremos, deixar de exigir aquilo que é nosso direito:

- o direito de viver e trabalhar no Alentejo. O direito a sermos nós a decidir e a construir o nosso futuro.

* Comunicação da CGTP/Alentejo no Congresso do Alentejo

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