REALIDADE VERSUS FICÇÃO
Terminadas as férias, para aqueles que as puderam ter, voltemos ao trabalho. Um
regresso que a classe política e a comunicação social gostam de apelidar de “
REENTRÉ”.
É um regresso à realidade que uns observam à distância e outros teimam em
ignorar.
Para os trabalhadores por conta de outrem, para os desempregados, os
reformados e pensionistas e também para o pequeno comércio tradicional não se trata de
qualquer regresso ou “reentré”, uma vez que, nunca saíram (nunca lhes permitiram sair)
dos problemas com que estão desde há muito confrontados. Problemas agora
brutalmente agravados pela perspectiva de desaceleração do crescimento (2,4% em
2023 e ainda mais em 2024), situação que não pode ser desligada da guerra na Ucrânia e
das sanções à Rússia, mas também das políticas das contas certas, do “aluno bem
comportado” que o governo teima em assumir à custa do crescimento económico, da
compressão do investimento público, da degradação da qualidade dos serviços públicos
e da desvalorização dos seus trabalhadores.
Os resultados já não podem ser escondidos. De acordo com os dados divulgados
pelo INE da evolução do emprego e desemprego no 2º trimestre destaca-se o aumento
do desemprego, o forte aumento da precariedade e a continuação da perda de poder de
compra dos salários.
O desemprego regista uma descida trimestral de carácter sazonal, mas cresce
perto de 9% em relação ao trimestre homólogo, com mais 25,7 mil desempregados, num
total de 324,5 mil.
A taxa de desemprego tem a mesma evolução, sendo agora de 6,1%, tendo
subido também entre os jovens menores de 25 anos para 17,2%, uma das mais elevadas
da União Europeia.
Acrescem os trabalhadores sub-empregados a tempo parcial, os inactivos
disponíveis e indisponíveis, num total de 300 mil. Em conjunto, a subutilização da força
de trabalho abrange 625,3 mil trabalhadores representando 11,5% da população activa e
também tendo aumentado face ao 2º trimestre de 2022.
Perto de dois terços do número real de desempregados não tem qualquer
prestação de desemprego ou, quando tem, o valor médio fica-se pelos 575 euros, e com
metade dos desempregados a receber até 500, abaixo do limiar de pobreza.
O crescimento do emprego registado este trimestre foi conseguido à custa de um
forte aumento da precariedade, que representa 80% desse aumento.
No espaço de um ano o número de trabalhadores com vínculos precários
aumentou em 88 milhares (+13%), verificando-se também um aumento face ao
trimestre anterior. De acordo com estes dados, há 756 mil trabalhadores com vínculos
de trabalho precários, correspondendo a 17,8% do total, mas entre os trabalhadores com
menores de 25 anos chega aos 57%.
Outro aspecto preocupante é a destruição de emprego entre os trabalhadores
licenciados que, no espaço de um ano reduzem-se em 128 milhares.
Os salários continuam a perder poder de compra. O rendimento salarial médio
mensal líquido dos trabalhadores por conta de outrem foi de 1.044 euros no 2º trimestre,
tendo crescido 0,5% em termos nominais, mas descido 3,7% em termos reais.
Os números mostram que para os que estão agora de “Reentré” é preciso arrepiar
caminho. Para os outros, para os que não reentram porque nunca saíram o caminho,
como bem sabem, é a luta. Luta em que não é necessário reentrar porque, tal qual os
problemas, nunca se saiu dela.
É preciso responder aos problemas que persistem e que causam a degradação das
condições de vida de quem trabalha. É preciso romper com o modelo de precariedade e
baixos salários vigente no nosso país e valorizar o trabalho e os trabalhadores.
Sim, é necessário e é possível. Assim o queiramos!
Diogo Serra
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