“era uma casa muito engraçada
Não tinha tecto, não tinha nada.”
A “modinha”
infantil aplicar-se-á ao edifício, propriedade do município, situado no Largo
Serpa Pinto e há muito adquirido para ali se instalar o arquivo municipal?
Não! Não é
possível cantar enquanto se desmorona um edifício que é testemunho vivo da
história recente da nossa cidade e um marco importantíssimo da história do movimento
operário de Portalegre.
Para os mais
novos o edifício em ruínas existente no “ Largo da Boneca” será só mais um entre
outros existentes na zona histórica da cidade. Outros recordá-lo-ão como sede
do Estrela e lembrarão as tardes e noites ali passadas em sessão de fervor
clubista ou praticando os inúmeros jogos de salão ali disponibilizados.
Para os menos moços
a recordação será a da Sociedade Vintém assim designada sem que muitos
conhecessem a razão de tal denominação. Só os mais idosos e interessados
conheceriam que a designação estava ligada ao custo da quota que os sócios
disponibilizavam. Mas adiante, os estudiosos da história da nossa cidade, os
estudiosos ou simples interessados da história do Movimento Operário e dos
inícios da sua organização em Portalegre sabem que ali, dentro daquelas paredes
agora em ruína total, se instalou em 1905, a primeira associação não mutualista
nascida na nossa cidade, a Sociedade União Operária.
Esta Associação,
fundada em 1896 sob a égide de George Robinson e de seu cunhado Pedro Castro da
Silveira, foi a primeira associação não mutualista a nascer em Portalegre e
apresentava como objetivos “o recreio, a
confraternização, a instrução e a ilustração”[1].
Os estatutos da
Sociedade União Operária – S.U.O. permitiam a inscrição de associados de todas
as classes sociais mas só aos operários era permitido serem sócios ordinários e
votarem e serem eleitos para os órgãos sociais. Os restantes, sócios
honorários, não tinham direito a voto nas assembleias gerais nem acesso aos
órgãos sociais.
A S.U.O. viria a
ter uma enorme adesão da população operária de Portalegre e foi a partir das
suas instalações que se organizaram as primeiras manifestações e desfiles
comemorativos do 1º de Maio, ainda no século XIX.[2]
Quando nos
deparamos com a situação de ruína a que o edifício chegou não podemos deixar de
condenar a nossa própria inércia perante o destruir das nossas memórias.
É verdade que já
houve intervenção do município para evitar o desabamento do telhado mas após
essa intervenção não só não se conhecem quaisquer projectos para o edifício
como se assiste (agora a céu aberto) à sua acelerada decomposição.
O velhinho
edifício sede da S.U.O. ( e também o antigo Teatro Portalegrense) mereciam uma maior atenção dos
Portalegrenses e em particular do seu município que, no caso da S.U.O. é
igualmente o proprietário do imóvel.
São conhecidos
os constrangimentos financeiros por que passa a Câmara Municipal de Portalegre
mas essa situação não pode justificar tudo e particularmente o alheamento dos
portalegrenses.
Em 1896 não foi
o município quem assumiu a constituição da S.U.O., foram os operários de Portalegre
e algumas das figuras tutelares da vida associativa.
Um mês depois de
constituída a associação já tinha 450 associados. O seu financiamento fazia-se
“vintém a vintém”.
E hoje?
Cento e vinte anos depois da sua constituição
não temos condições para nos quotizarmos (população, empresas, autarquias) e
não deixarmos cair a sede da primeira Associação não Mutualista da cidade de
Portalegre?
Diogo J. Serra
*Publicado no Jornal Fonte Nova de 31-05-16
[1] António Ventura,
Portalegre – Roteiros Republicanos, Ed QUIDNOVI,2010
[2] As Primeiras manifestações públicas ocorreram no Teatro Portalegrense mas,
após a fundação da SUO passaram a ser organizadas na sua sede ou, no caso dos
desfiles de rua, com partida e chegada às suas instalações.
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