sexta-feira, 18 de junho de 2010
A Regionalização é necessária. Não se podem queimar etapas!
Logo em 27 de Maio de 1992, quando na Ponte de Ajuda – Olivença se procedeu à assinatura do protocolo de colaboração entre a Extremadura e o Alentejo, os mais atentos puderam perceber que dificilmente teria eficácia uma parceria cujos parceiros não estavam em pé de igualdade.
De facto, quando o Presidente da CCDR Alentejo, então o Dr. Carmelo Aires, assinava o documento em representação do seu ministro, não lhe podia garantir a mesma dignidade que o então Presidente da Junta de Extremadura – Juan Carlos Ibarra ali colocava. O primeiro assumia-se como um funcionário às ordens do poder centralista de Lisboa, enquanto que o segundo falava em nome de todos os extremenhos, sustentado no facto de ser o presidente eleito do governo autonómico de uma região espanhola.
Era um tempo em que os responsáveis locais dos diferentes órgãos descentralizados do estado necessitavam de autorização superior para atravessarem a fronteira, o que originava sempre uma de três situações: os parceiros extremenhos deslocavam-se a Elvas, Portalegre ou Évora, não se concretizava o encontro necessário ou, o que era mais corrente, o funcionário atravessava a fronteira como se a deslocação fosse turística.
Ainda assim, fruto de inúmeras boas-vontades e do crescimento dos que viam no derrubar das fronteiras um desafio para os territórios para quem as ditaduras de Salazar e de Franco haviam destinado os mais baixos patamares de desenvolvimento dos respectivos países, a cooperação foi avançando.
Para quantos há muito haviam percebido que Badajoz, Cáceres, Mérida, Elvas, Portalegre e Évora estavam muito mais próximas entre si (e não falo só em quilometragens) do que cada uma delas com Madrid e/ou com Lisboa, para os que viam a Raia como uma oportunidade de atingirem os patamares de bem estar que sempre lhes foram negados, o tempo era de estreitar distâncias, de romper as fronteiras que se lhes foram colocando ao longo de séculos e que não eram, longe disso, apenas as fronteiras geopolíticas.
E assim fomos abrindo caminhos, como diz o poeta, caminhando. Em 1994 na Ponte de Alcântara era a CCDR do Centro a firmar protocolo idêntico com a Extremadura.
Os trabalhadores, os homens e mulheres da raia, já há muito haviam eleito a zona raiana como ponto de união e a fronteira como mero obstáculo imposto de longe e que era preciso contornar.
Fora assim nos tempos das ditaduras sempre que foi necessário esconder e apoiar as vítimas da guerra civil e os defensores da república espanhola, fora assim, sempre, quando a fome de um e outro lado da raia impunha a passagem sofrida por trilhos da noite com os carregamentos de café, de carnes e outros produtos, era agora assim, de novo, para quantos passavam a fronteira para procurarem no “Valle del Jerte” ou nas “Vegas del Guadiana” o trabalho que no Alentejo lhes fora negado com a destruição da Reforma Agrária.
A realidade nos campos, vilas e cidades do Alentejo e da Extremadura em articulação com a vontade dos organismos de cooperação internacional criados nos seio da União Europeia onde os dois estados se integraram foi tornando “mais natural” o fim das fronteiras políticas e, mesmo os organismos oficiais foram “fazendo caminho” sob as politicas desenvolvidas pela Associação das Regiões de Fronteira da Europa – a ARFE.
Constituíram-se Comunidades de Trabalho, criaram-se Gabinetes de Iniciativa Transfronteiriça, desenharam-se e executaram-se projectos comuns a duas ou mais regiões e no que ao Alentejo diz respeito estimulou-se uma estratégia de cooperação assente em três eixos principais: a cooperação territorial, a cooperação temática e a cooperação sectorial.
No âmbito das políticas europeias de coesão territorial aprendemos a conhecer-nos e a programar e executar politicas que rompiam as fronteiras (já não as fronteiras politicas) ainda existentes: as fronteiras culturais e linguísticas, as fronteiras do desenvolvimento desigual existente de cada um dos lados da raia.
Os trabalhadores e trabalhadoras e o seu movimento sindical estiveram sempre na linha de frente desse caminhar. Aos seminários e encontros temáticos oficiais (onde sempre participaram) juntavam o trabalho transfronteiriço na Extremadura e no Alentejo em defesa dos trabalhadores fronteiriços, prestavam apoio aos “temporeros” nos campos extremenhos e aos médicos e enfermeiros que vinham para Portugal, aos camionistas que utilizam as vias transfronteiriças, aos muitos outros que semanalmente se deslocam num caminhar entre o trabalho e a família.
Para que tal fosse possível foram assinados protocolos entre os sindicatos alentejanos e extremenhos através dos quais se garantia apoio sem restrições aos associados que passavam “a fronteira” para trabalhar e, depois constituída uma estrutura de direcção sindical transfronteiriça – O Conselho Sindical Inter Regional Alentejo/Extremadura que foi, durante anos, a única organização transfronteiriça legalmente existente.
Muitos dos Municípios do Alentejo e da Extremadura têm hoje projectos comuns. Termos como euro-região, euro-cidade, comunidade de trabalho e outros, fazem parte não apenas do nosso vocabulário nas do nosso quotidiano e, a 21 de Setembro último, na Casa das Artes e Cultura do Tejo, em Vila Velha de Ródão, uma instalação que é um bom exemplo das politicas de cooperação transfronteiriça, foi assinado o protocolo de constituição da Euro Região Alentejo-Centro-Extremadura a EUROACE.
A constituição da EUROACE pressupõe um novo passo no caminho, sem barreiras, que se quer percorrer. Não tendo personalidade jurídica a EUROACE possui estrutura orgânica e será presidida rotativamente por cada um dos territórios que o integram sendo o seu primeiro presidente D. Guilhermo Vara, Presidente da Junta de Extremadura.
Tendo como objectivo fomentar a cooperação transfronteiriça e inter-regional entre as três Regiões que a compõem pretende actuar prioritariamente nas áreas que entende como fundamentais: agricultura, recursos naturais e ambiente; protecção civil, desenvolvimento local e ordenamento do território; competitividade regional, inovação e desenvolvimento tecnológico; energia, transportes e comunicações; património, cultura e turismo; educação, formação e emprego; juventude e desporto; saúde e serviços sociais.
Os trabalhadores e trabalhadoras de um e de outro lado da “fronteira” e os seus sindicatos estão, por tudo quanto fizeram, em perfeitas condições para assumirem uma postura de apoio à construção de novas formas de cooperação mas também, porque o trabalho feito lhes dá essa autoridade, para reivindicarem novos patamares de cooperação.
Como já o era em 1992, é agora absolutamente necessário que os diferentes parceiros não se situem em patamares de poder e representatividade muito diferentes.
Não é expectável um funcionamento e crescimento regulares se de um lado se sentar um poder real e legitimado pelo voto popular e do outro um corpo de funcionários de um poder distante que, por mais vontade e disponibilidade que possuam, nunca poderão sentir-se como iguais nesta parceria.
A criação da EUROACE junta-se assim às outras muitas razões que tornam imperioso dotar as diferentes regiões e em particular o Alentejo de uma estrutura de poder legitimado pelo voto e com competências próprias: a Região Administrativa ALENTEJO.
A hora é de mudança. São cada vez mais as razões que a justificam.
Diogo Serra
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1 comentário:
Dada a temática abordada, tomei a liberdade de publicar este V/ "post", com o respectivo link, no
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Regionalização
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Cumprimentos
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