Olhar com olhos de ver!
Os “Olhares sobre o Norte Alentejano”
levaram-me (e a dezenas de outros interessados) a Castelo de Vide. No Cine-teatro
local, IDECI e os seus convidados, brindaram-nos com uma interessante
conferência que, pela temática em análise e pela qualidade dos conferencistas
deixou-nos mais conscientes dos nossos recursos enquanto região e população,
das nossas fragilidades e desafios mas, igualmente, reforçou a esperança de
que, ainda é possível.
Ali foi reafirmada a necessidade do
território resolver ou minimizar a grave situação demográfica que nos afecta, a
necessidade absoluta de atrairmos gente e sobretudo garantir condições de
trabalho e de rendimentos que estimulem a fixação dos nossos jovens. Falou-se,
e bem, da necessidade de garantir-lhes trabalho, rendimentos, segurança, tempos
de convívio e de lazer, condições que permitam e estimulem a compatibilidade do
trabalho e da vida familiar.
Na conferência houve até espaço, para um
“departamento do governo central” nos tentar vender a bondade das políticas que
todos encaramos como corresponsáveis pela situação que vivemos. A medida que
nos veio vender já distribuiu milhares de euros e conseguiu trazer para o
distrito de Portalegre desde 2020, através do seu programa regressar, 59
(cinquenta e nove) ex-emigrantes…
Entretanto os grandes meios da
comunicação social descobriram agora uma realidade sentida e denunciada desde
há muito, pelos trabalhadores e as suas estruturas representativas: a
precariedade no trabalho e os baixos salários são os principais factores que empurram
os jovens trabalhadores para as grandes metrópoles e aceleram o despovoamento
de cada vez maiores faixas do território nacional.
Como também em Castelo de Vide nos foi lembrado,
o salário médio em Portugal é baixíssimo mas ainda assim, o salário médio no
Alto Alentejo é significativa-mente inferior.
Aqui, como no todo nacional, aos baixos
salários junta-se a enorme precariedade que se abate sobre quem trabalha mas,
especialmente sobre os jovens trabalhadores.
Portugal é um dos países da União Europeia com
mais trabalhadores com vínculos precários. O terceiro no Pódio diz-nos agora o
Eurostat e, sabemo-lo nós, no último ano, 80% dos contratos de trabalho
celebrados foram contratos a termo e/ou com outros graves factores de
precariedade.
No primeiro trimestre deste ano,17,2%
dos contratos de trabalho por conta de outrém eram precários. E, isto a
comunicação social não nos traz, Portugal é também dos que mais beneficia o
capital e prejudica salários com impostos.
Pois bem, detectadas as razões que mais
influenciam a nossa situação demográfica seria fácil, penso eu, eliminá-las ou
minimizá-las e iniciarmos a inversão do caminho que temos vindo a percorrer.
Fácil? Sim e não!
Fácil se existisse vontade politica
alicerçada numa estratégia de desenvolvimento harmonioso e sustentável para o
país, que valorizasse as regiões mais debilitadas pela visão centralista e de
pilhagem dos recursos e da esperança das populações mais afastadas dos centros
de decisão.
Não porque se mantém no poder a mesma
vontade de viver e nos impor, não a democracia/liberdade cantada por Sérgio
Godinho e sonhada por milhões de portugueses mas a democracia/liberdade de que
Mário Soares foi “pai”.
Já agora, importa recordar que foi o
Primeiro Governo Constitucional que criou a possibilidade legal de precarizar o
trabalho. É desse governo, liderado por Mário Soares, a “imposição” do
decreto/lei 781/76 que recuperava uma medida do fascismo e permitia a
contratação a prazo.
Disseram-nos que era uma medida
temporária mas hoje, sabemo-lo dolorosamente, foi a abertura de uma porta que
nunca mais se fechou…
Diogo Júlio Serra