quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

O Alentejo tem sede de “gente”!

O Alentejo tem sede de “gente”!



O Alentejo, como a generalidade do interior português, é um território onde se acentuam o despovoamento e o envelhecimento dos que persistem em ficar.
De 1960 a 2011 a situação não parou de agravar-se, como confirmam os censos realizados.
No ano de 1960 residiam nos 47 concelhos alentejanos, 770.965 pessoas enquanto em 2011, último censo realizado, esse número era de apenas 509.149. Ou seja, em apenas cinco décadas o Alentejo perdeu 33,56% da sua população.
A perda de população tem vindo a intensificar-se em todo o território. Os censos de 2011 mostram que em toda a região apenas cinco concelhos registaram, entre 2001 e 2011, ligeiros aumentos populacionais: Sines (5,03%); Campo Maior (4,8%); Viana do Alentejo (2,33%); Vendas Novas 1,88%) e Évora (0,98%).[1]
Acresce que a perda contínua da população atinge fundamentalmente os alentejanos em idade ativa o que contribui para o acelerado envelhecimento da população residente. Tanto mais, que no mesmo período em que baixava a população total, baixava igualmente a população ativa e crescia exponencialmente a população residente com mais de sessenta e cinco anos.
A questão demográfica é hoje um dos principais problemas que se coloca ao Alentejo que já não tem capacidade de se auto regenerar, seja no contexto natural, seja pela incapacidade de atração de novos residentes pelo que importa encontrar caminhos capazes de parar e inverter o trajeto que nos tem impelido para esta situação.
Refletir sobre as razões e as políticas que são a origem do problema vem sendo feito desde há muito. Aliás, no Alentejo o que não faltam são bons diagnósticos. Onde sistematicamente se tem falhado é na definição de estratégias fruto, sobretudo, do medo que o Alentejo desenvolvido e com gente sempre provocaram nos detentores do poder.
O que nos tem condenado a uma situação de marginalizados é a postura latifundista que nunca deixou os governantes e as chamadas elites regionais. Só esse sentimento alicerçado nas políticas impostas pode justificar as dificuldades em mantermos e atrairmos jovens e menos jovens quando dispomos na região de tudo o que de melhor existe no país no que respeita a qualidade ambiental, riqueza cultural e patrimonial, segurança, infraestruturas de ensino e de lazer.
O Alentejo tem sede de gente mas tem todas as condições para a atrair e fixar. Para tanto basta adicionar às excecionais condições naturais e culturais um projeto de desenvolvimento que garanta emprego de qualidade aos que aqui vivem e aos muitos que gostariam de aqui viverem.
Potenciar as condições existentes e transformar o território garantido o bem-estar das suas gentes tem sido e continuará a ser o combate de quantos, pessoas e organizações, desde há muito reclamam para o Alentejo um tratamento em pé de igualdade com o que recebem outras regiões do país.
O Alentejo não precisa de “favores”. Precisa e exige ser tratado com justiça!
Não reclama tratamento de favor quando exige o direito a ter vias rodoferroviárias que quebrem o isolamento a que foi votado. Vias que permitam a entrada no território e potenciem as excecionais condições para o turismo mas que permitam também, o contacto célere dentro da região e desta para o exterior.
Vias rodoferroviárias que potenciem a privilegiada situação geográfica da região entre as áreas metropolitanas de Lisboa e Madrid e corredor privilegiado para o comércio entre o arco atlântico e a Europa (corredor Sines/Badajoz).
Não reclama tratamento de favor, mas justiça, quando exige aumento do investimento público em infraestruturas, nomeadamente na ferrovia (passageiros e mercadorias) e nos portos. Não só por ser necessário inverter o desequilíbrio existente a favor da rodovia, patente quer no movimento de passageiros quer no de mercadorias, e do transporte individual quer pela necessidade de reverter as politicas erradas que levaram a que vastas áreas do território tenham no que ao transporte de passageiros diz respeito, regredido ao ano de 1862. [2]
O Alentejo pode e quer contribuir para o seu desenvolvimento e para o desenvolvimento do país.
O território tem condições de contribuir para o aumento das exportações e a diminuição das importações em particular no sector alimentar, onde o país não é autossuficiente. A nossa dependência alimentar é mais elevada nas leguminosas secas onde a produção só chega para satisfazer 8,5% das necessidades do país, mas é igualmente muito significativa nos cereais e arroz (produzimos apenas 28,7% do que consumimos), nas raízes e tubérculos (56,7%), nas carnes e miudezas (71,8%) e nos frutos (76,3%).
A produção agroalimentar é um dos eixos de desenvolvimento em que a região tem condições e competências para ajudar a satisfazer as necessidades nacionais (dispensando as importações) e ainda exportar como já acontece com os vinhos de enorme qualidade que aqui produzimos e garantindo a melhoria das condições de vida dos trabalhadores e das populações.
O Turismo é outro dos eixos fundamentais para o desenvolvimento que queremos. Temos todas as condições para o atingir: mar, sol, montanha, planície, cultura, património natural e construído, formação de excelência e reconhecimento internacional precisamos tão só de políticas que apostem em infraestruturas, em particular aeroportuárias e ferroviárias, que quebrem o isolamento a que temos sido votados e permitam a entrada e saída rápida e segura para os alentejanos e para os visitantes.
Porque certos de que é possível inverter a situação que nos foi imposta os trabalhadores alentejanos e as suas organizações de classe tem vindo a lutar por um conjunto de mudanças que entendem necessárias e em particular:
Uma política económica alternativa para o país, com base no desenvolvimento do tecido produtivo, na dinamização do mercado interno, através do aumento dos salários e das pensões, no crescimento das exportações e na substituição de importações, condição indispensável a podermos diminuir a nossa dependência face aos défices externos (alimentar, tecnológico, energético).
A adoção para o Alentejo de um Plano Imediato de Intervenção Económica e Social capaz de desenvolver e modernizar o sector produtivo, que inclua a agricultura, a pesca e a reindustrialização bem como os sectores de ponta como as energias renováveis, a aeronáutica e as chamadas atividades verdes e garanta mais e melhor emprego na região e a melhoria das condições de vida dos trabalhadores e das populações.
Pela primeira vez em muitos anos, fruto das alterações politicas verificadas com a criação de maiorias aritméticas e politicas que apostam num novo paradigma de desenvolvimento para o país, o Alentejo pode retomar o sonho!


publicado na REVISTA alentejo nº 39


[1] INE, censos 2011, resultados definitivos
[2] Ano em que o transporte ferroviário (Linha do Leste) chegou a Abrantes.